Chulé!
Aquele
maldito chulé determinara o rumo de sua vida. Logo adolescente usando tênis sem
meia o dia inteiro e só tirando para dormir, adquirira um odor próprio
insuportável até para ele mesmo.
Inquieto
e envergonhado com aquele fedor de lama podre com abutres em decomposição,
lavava os pés com esmero e aplicava cremes e perfumes, mas não adiantava. Nos
lugares públicos evitava ficar próximo a ventiladores pois o odor putrefato se
espalhava rapidamente e fazia pessoas passar mal, vomitar e até desmaiar. Tinha
que fugir do local antes que descobrissem de onde vinha a fonte dos
desprazeres.
Achava
os seus pés mergulhados no pântano do inferno, médicos experientes desistiram
de trata-lo, outros se recusaram e alguns até sugeriram que os amputasse.
Era
impossível namorar porque a proximidade já fazia com que as garotas fugissem
traumatizadas. Emprego só como desentupidor de fossas, e a presença dele
triplicava o problema.
Pesquisando
na internet se dispôs a buscar tratamento no rio sagrado da Índia, mergulhando
ao lado de cadáveres; na Antártida congelara os pés a ponto de perde-los, mas o
mau cheiro derretera o gelo e mantivera os seus pés intactos.
Na
África buscara magia, mas não funcionara. Caminhara sobre brasas em vão, envolvera
os pés em placas de concreto... Estava destinado a viver impregnado pelo fedor
mortal que afastava moscas, insetos e seres humanos. Infiltrara desodorante nos
dedos, esfregara rosas nos pés, já estava desistindo de viver quando um sábio
apareceu assegurando a solução para os seus problemas.
Embevecido
e emocionado prometeu no homem muito dinheiro caso obtivesse êxito em acabar
com aquele chulé indesejável. Depositou metade da quantia prometida e o sábio
lhe ofereceu um teste simples. Caso fosse útil garantiria o fim dos maus odores
para sempre!
Achou
estranho quando recebeu do sábio um pregador de roupas daqueles de madeira.
Aquele era o teste?! O homem simplesmente tapou o seu nariz com o pregador por
alguns minutos e ele deixou de sentir aquele bafo terrível das fossas do mundo
inteiro!
Esperançoso
depositou o restante do dinheiro e recebeu uma máscara cirúrgica descartável
para utilizar diariamente. Aquele simples gesto resolvera a sua vida! Estava feliz
e descuidado sem aquele mau cheiro que o envergonhava. Não percebia mais se as
pessoas se afastavam ou despejavam até as tripas para fora na sua presença. Não
saberia se o problema estava no seu nariz ou nos seus pés fedorentos. Isso não
era mais importante, estava livre para sempre daquele problema aparentemente
insuperável e passou a comemorar a própria existência como uma pessoa comum.
Soluções simples, eficazes ou psicológicas? Quem dirá?
Marcelo
Gomes Melo
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