Rompendo
com a crueza do destino
Atire
as cartas sobre a mesa e vamos conversar em outros termos, já que a mudez
chique que envolve a nossa rotina vem mais de mim do que de você, que dá a
entender que um bom barraco de vez em quando desentope as coronárias e limpa os
olhos de uma vez, vertendo lágrimas salgadas e oxigenando o cérebro.
É fato que sempre um dos dois morde os
lábios e engole o veneno que mata lentamente, enquanto o outro expele
verborragicamente, tilintando copos e lustres, mas mantém a sanidade depois de
incomodar vizinhos e presentes, constrangendo sem nenhum pudor e esquecendo tal
e qual alegam os bêbados no dia seguinte a um vexame catastrófico.
Por isso vamos à luta, cara a cara,
atrás de um muro formado por duas xícaras de café, fingindo ser civilizados ao
mesmo tempo em que os olhos lançam relâmpagos e a boca trovões, sob uma nuvem
negra que insiste permanecer apenas no local em que estamos, chovendo frio,
promovendo calafrios e mal-estar.
Se é verdade que o embate vigoroso no
confronto de ideias liberta e salva qualquer relacionamento, a equação deve ter
sido manipulada de alguma forma, pois sempre um dos dois cederá, ficando com aquele gosto amargo
na boca e a péssima sensação de fraqueza por ter aberto mão de princípios em
nome da boa convivência, perdendo espaços e interiorizando cada vez mais os
próprios pensamentos.
O vencedor, por sua vez, não percebe
que venceu na marra e continua a avançar exigindo mais e mais, até provocar uma
explosão sem volta que magoará a ambos e deixará cicatrizes visíveis. Mesmo
assim insistirá que não venceu os embates e não corrompeu toda a lógica da
igualdade de espaços conforme o caráter e o perfil de cada um.
É
realmente difícil continuar com essa lenda de amor perfeito e entendimento completo,
quando a impossibilidade é gritante, portanto, corrobora a existência dos
contos de fada, de amores eternos e convivência pacífica, igualitária e
magnífica. Isso só acontece no cemitério, com os dois lado a lado cobertos de
flores e sem mais nada a dizer.
Se tudo evolui, os sentimentos mudam e
é impossível manter a mesma visão do mundo por muito tempo. Os fortes aceitam as falhas, contabilizam as dores e seguem em frente como podem, admirados pelos ingênuos, ironicamente sorrindo dos elogios recebidos por uma longevidade que nada
tem a ver com comunhão de pensamentos, mas de romper com a crueza do destino
custe o que custar. E o conseguem.
Marcelo
Gomes Melo
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