As
canções boas para beijar
O saudosismo acomete os
mais velhos em dias chuvosos, nublados. Numa embarcação modelo italiano, pelos
canais de Veneza do pensamento, sensações de tempos passados retornam produzindo
um turbilhão de sonhos e um nó na garganta, na maioria das vezes por delícias
inigualáveis e particulares de cada geração.
Também significa que a idade vem avançando, incólume, e
experiência é um acessório importantíssimo para sobreviver à selva da modernidade
sem rancores, entendendo que os costumes mudam e a vida segue, mas a memória
garante um lugar aos momentos felizes para sempre na história.
Um dia, ouvindo uma canção do Tavito, que já era
considerada flash back à época, lembrei-me dos preparativos adolescentes
realizados durante a semana para os bailinhos realizados todos os domingos,
revezando as casas de cada amigo em que aconteciam. Aos sábados a balada
acontecia em clubes nos quais havia shows. Em São Paulo, locais como Toco,
Massa Rara, The Channel, Radar Tantã, Fofinho’s club, Sunday entre muitos
outros faziam a alegria da molecada.
A canção do Tavito, “Rua,
ramalhete”, com versos que diziam coisas como “muito prazer/Vamos dançar/E eu
vou falar no seu ouvido/Coisas que vão fazer/Você tremer dentro do vestido”,
era considerada uma canção boa para beijar, como centenas de outras,
principalmente as internacionais. Isso fazia com que os garotos ficassem à
noite em seus quartos, torcendo para que ninguém entrasse e fizesse barulho
durante as gravações das fitas cassete, única maneira de registrar as músicas
românticas escolhidas a dedo para a hora da pegação no baile.
Nomes de astros como Lionel Ritchie, Phill Collins, Betty
Wright, Whitney Houston, Spandau Ballet, Luther Vandross, Barry White, Smokey
Robinson eram garantia de uma seleção maravilhosa das chamadas músicas lentas.
Com essas músicas, em uma seleção de aproximadamente 90 minutos sem interrupção
e à meia luz, casais jovens e saudáveis tinham toda a oportunidade para beijar
à vontade!
À hora das seleções de
balanços todos dançavam separadamente, bebiam vinho e refrigerante, tentavam
superar a timidez e arranjar uma menina bonita para a hora das lentas, a hora
do beijo. Alguns se davam melhor e logo obtinham um par; outros tremiam e
hesitavam, suavam e quase desistiam, a não ser que a oportuna ação cupido dos
amigos funcionasse, colocando-os no circuito do amor descompromissado.
Durante as canções havia a chance de apertar um pouco mais,
acariciar os cabelos da garota, fazer elogios... Trocar carícias e beijos.
Muitos beijos. A intensidade dependia do poder de convencimento e atração de
cada um. Raramente se chegava além disso, mas eram as noites perfeitas.
No dia seguinte o papo era sempre o mesmo: pegou? Não
pegou?! Comeu?! Nem um beijo?! Ahhhh, deixa de ser covarde, ela te deu mole e
você pipocou!
Imagino que entre as garotas o papo fosse o mesmo; e o
restante da semana serviria para garimpar novas canções românticas e sonhar com
mais amor e mais festa. Hoje isso parece tão antigo! Bizarro, até. Mas era
divertido; ah, isso era!
Marcelo
Gomes Melo
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