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Louco para transar, doido para amar (O início)
 

          Finalmente, depois de quinze dias afastados por causa de uma briga boba, ela telefonou. Ficamos longe, afastados, sem trocar uma palavra; ela não atendia nem aceitava conversar comigo em hipótese alguma, então era uma bandeira branca sendo acenada e eu teria que agarrar com unhas e dentes.

          A razão para o nosso desentendimento foi a seguinte: era sábado e à noite teríamos uma festa à qual deveríamos comparecer, e ela só falara nisso durante toda a semana anterior. Eu tinha um jogo de futebol à tarde, mas confirmei a presença e tranquilizei-a. Era só um jogo, haveria tempo para a festa sem problemas.

          Eu só não contava com a briga generalizada que levou ambos os times a parar na delegacia de polícia mais próxima. É claro que os ânimos se acalmaram e todos entraram em concordância, mas o delegado nos deu um chá de banco Ficamos todos sentados, como crianças na diretoria depois do sermão pelo período entre as 17h00 e as 24h00.

          O celular com a bateria descarregada impediu qualquer comunicação, e quando cheguei ao apartamento dela por volta de uma e meia da manhã, é óbvio que já havia ido e o humor não estaria muito bom na volta.

          Permaneci vestido com o uniforme do time, achando perfeito ter recebido uma cotovelada no supercílio, que estava aberto e inchado; seria uma prova real do que acontecera. Também não carreguei o celular. Eram as provas produzidas que aliviariam a fúria mortal que com certeza a alimentava.

 

          Ela voltou da festa antes das três da manhã, bonita demais, maravilhosamente cheirosa, e com disposição para a guerra. De início pareceu chocada com a minha aparência, mas não foi o suficiente. A raiva foi muito maior. Quando expliquei que não tinha como entrar em contato e mostrei o celular descarregado, ela foi irredutível: “Por que não pediu o celular do delegado emprestado? Era por uma boa causa!”. E foi blá, blá, blá, blá, sem aceitar nenhuma defesa de minha parte. Pedir o celular do delegado! Mulheres!

          Já irritado tentei usar a psicologia reversa e contra atacar. Acusei-a de ter ido bonita demais, sozinha, e que provavelmente recebera inúmeras cantadas! Isso foi pior ainda. Indignada, passou a reclamar mil vezes mais e a ficar ainda mais insuportável. Não aguentei mais; peguei minha mochila com as chuteiras e tomei o rumo de casa, profundamente nervoso.
          Agora, quinze dias depois, ouvia aquela voz delicada da minha rainha. Em princípio foi daquele jeito, meio frio, ambos desconcertados; “Tudo bem?”; “Melhorou do ferimento?”; “Sim... E você, como está?”... Depois a coisa foi melhorando. A fiz rir com uma piada sem graça, depois falei que não aguentava de saudades.

          A voz dela estava naquele tom suave, cheio de promessas, e eu naquela seca maldita, louco para transar, doido para amar! Só que as mulheres, com seu estilo peculiar, em vez de irem em uma linha reta, direto ao ponto, preferem dar uma volta desnecessária, criar um labirinto entre elas e o ponto em que desejam chegar. Essa tendência se manifestou logo. Lá vem ela “sugerindo ditatorialmente” que fôssemos ao cinema assistir a um filme sensacional que estava estreando.

          Rapidamente dei uma conferida na carteira. Eu tinha apenas quarenta paus, nada além disso. A calculadora em meu cérebro se pôs a trabalhar freneticamente, enquanto a ouvia dizer que a pegasse na entrada do prédio lá pelas 20h00. Foi aí que lembrei de que o tanque estava na reserva, o cartão de crédito estourado e meus olhos acendiam e apagavam em neon: “Sexo!”, “Sexo!”, “Sexo!”. A minha voz adquiriu um tom lamentoso e eu disse: “Meu inesquecível amor, o carro está no conserto”. E emendei: “Faz assim; vem pra cá, eu compro o filme pirata na feira, comemos pipoca e ficamos mais à vontade... Hein, hein?”.

 

          Nada disso. A Hitler de saias concluiu sensualmente: “Vamos de táxi, amor, não tem problema”. O cinema custava oitenta cada um; o táxi, ida e volta, uns duzentos; pipoca, sorvete, refrigerante mais trinta reais. Eu tinha quarenta! Já via a chance de transar indo embora. Teria que abrir o jogo e falar que estava duro. E sem grana. Assim que abri a boca para destruir minha chance sexual, a campainha tocou. Pedi a ela que aguardasse à linha e, xingando por dentro, fui atender. Era o meu vizinho, gente boa, pedindo o carro emprestado para levar a esposa ao aeroporto; voltaria em duas horas. Falei que não haveria problemas, mas que o tanque estava vazio. Ele respondeu: “Fica tranquilo, eu encho o tanque pra você”. O meu estômago se contorceu de alegria! Joguei as chaves na mão dele. E comemorei como se fosse o Pelé marcando um gol, com um soco no ar.

          Voltando ao fone, meu raciocínio sexual era maquiavélico. Nada como um homem inspirado pela vontade de transar. Chegava com o carro, parava num lugar escuro a caminho do cinema... Papo vai, papo vem, ela nem se lembraria mais do filme. O amor se faria ali, livremente, atrás de um armazém abandonado, em cima do capô do carro. Erótico. Exótico. Sensual. Do jeito que as mulheres sonham, aventura pura!
          Senti o sorriso devasso quase sem som que ela deu quando contei que era o mecânico dizendo que o carro ficaria pronto em duas horas. Mas continuou insistindo naquele malfadado filme!

          Quase iniciei a terceira guerra mundial, mas os arrepios que me apavoravam, a vontade de amassar aquela mulher macia, a febre do rato da busca pelo prazer me impediram de ficar irritado. Ainda estava sem dinheiro; se ela tivesse que pagar iria ficar bem brava, me acusando de ser insensível e nada romântico, justamente por ser o encontro da reconciliação. Não fosse por isso não teria problema algum em gastar conosco. Mulheres e seus dogmas! Como se pobreza fosse sinônimo de falta de sensibilidade! Adeus noite de prazer!

 

          Voltei o foco às minhas necessidades intrínsecas. Tenho que ser esperto, desviar a atenção dela e fato de acreditar que um motel é mais romântico e seduzi-la a querer imitar Sharon Stone na minha cozinha, Demi Moore no tapete da sala, Jennifer Lopez na lavanderia ao invés de naquela cama gigantesca, hidromassagem, cadeiras especiais, óleos e perfumes... Para a minha surpresa ela tocou nesse assunto, sorrindo com alegria travessa. Falou com aquele tom sem vergonha, lotado de promessas, espaçando as palavras, causando impacto na minha frágil estrutura que implorava por sexo brutal, cavernoso; por carícias tão leves que causavam a impressão de serem as últimas antes de morrer de amor. Tesão encalacrado fazendo coisas com a mente de um homem!

          Minha respiração sumia e voltava, inconstante. Meu coração batia e parava, parava e batia; ela finalmente concluiu o período e eu apreendi que, depois do cinema, dos beijos e carícias, do pega-pega, sussurros e dramas, voltaríamos para o apartamento dela. Lá haveria algo preparado para nós dois. Era algo maravilhoso e importante; inédito, segundo entendi. Faríamos uma comemoração...

          Eu estava realmente a ponto de ter um treco, sorrindo e apertando o fone. Comemoração,é? Sim! Algo que jamais acontecera entre nós. Eu iria adorar porque seria marcante e inesquecível nas nossas vidas. Uau! Conta, conta! O que é que eu vou ganhar? Ela apenas sorria e dava pequenos gemidos matadores. Ambos ganharíamos. Ela sempre hesitara em fazer isso,mas agora era o momento certo. Meus pés batiam no chão incessantemente, de tanta apreensão. Eu seria capaz de roubar para levá-la ao cinema naquela noite! Jamais perderia aquele prêmio fenomenal. Muitos caras matariam por isso! Eu também!

 

Continua...
                                  Marcelo Gomes Melo
 

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