O
que só as deusas demonstram
Jezebel,
nas manhãs de domingo em meu chalé nas
montanhas, hesito em me erguer dessa cama quente na qual realizamos todos os
nossos planos pecaminosos, gostosos e revigorantes para, abalroado pelo frio
cortante descer o caminho de terra entre a mata para marcar presença na missa,
como um rude cavalheiro de fé!
Com o cheiro cativante do seu corpo em
meu corpo, relembro os seus movimentos desinibidos recentes, inebriando o meu
cérebro simplório, me pedindo coisas que eu jamais imaginaria, mas realizava
feliz com o prazer alcançado, alucinação momentânea que ao amanhecer deixaria
em meu pensamento de fé uma leve vergonha, um embaraço juvenil, um medo de
punição pelos desvarios noturnos com direito a tudo, sem nenhuma proibição.
Da cozinha, o cheiro forte de café
recém passado, as torradas com manteiga e ovos com bacon fazem remoer o meu
estômago, faminto em recuperar as forças gastas em uma batalha sensual
inacabada. O meu cérebro, Jezebel, matreiro, insistia em lembrar que você
estava lá, guloseima das guloseimas, trajando a minha camiseta apenas, fazendo
comida para me incentivar a passar o domingo na cama, esquecendo os deveres
religiosos de há tempos, destemperando a minha confiança, acusando a minha
eterna fraqueza humana sem perdão. Arderia eu, Jezebel, no fogo dos infernos
além das chamas de suas coxas quando a minha hora chegasse, em nome dos
prazeres carnais oferecidos por você com tão grande talento?
Eu não sei, então apelo à vã filosofia
no momento em que nu, me enrolo no cobertor e caminho descalço até você para
recomeçar o domingo de nós dois, abandonando qualquer remorso com uma peça
eficiente do pensamento humano: uma coisa de cada vez, amanhã é outro dia e
terei todas as chances de reparar os meus supostos pecados até o próximo final
de semana, quando nos reencontraremos como sempre, eu desconfiado, você com a
expressão tranquila e despreocupada que só as deusas demonstram.
Marcelo
Gomes Melo
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