Havia
uma forca na varanda. Pelo menos era o que parecia daquela distância, ao
anoitecer vista da casa do outro lado da rua. A iluminação era precária, só se
via uma vela tremular através da janela, o resto era escuridão.
Aqueles metros de corda pendurados na
varanda com o que parecia ser um laço na ponta chamou a atenção dos vizinhos da
casa frontal, tendo em vista que o ermitão que lá morava mal era visto à luz do
dia, carrancudo e arredio, claramente sem intenção de socializar com os
vizinhos curiosos.
Eram casas construídas em suas
fazendas ou sítios, longe umas das outras, o que facilitava a intenção de não
interagir com ninguém do homem que lá morava. As crianças o tinham em conta
como um velho rabugento que jamais devolvia as bolas intactas quando
acidentalmente caíam dentro de sua propriedade. Voltavam murchas, esfaqueadas,
sem uso para o esporte que praticavam.
O homem barbudo de cabelos longos e
grisalhos trajava sempre camisa branca de mangas dobradas e suspensório em vez
de cinto para segurar as calças no trabalho. E as botas de vaqueiro completavam
o visual. Era algum tipo de psicopata, diziam as mulheres umas às outras, e
evitavam falar com ele, convidá-lo para algum bazar beneficente na igreja.
Aos homens restava a teoria de que ele
sofrera alguma desilusão amorosa e não queria mais contato com as mulheres em
geral.
A forca só era vista à noite, quando a
vela acesa na janela da cozinha tremulava açoitada pelo vento, causando um
efeito aterrorizante.
Será que o homem iria se matar? Tinha
mesmo cara de psicopata, diziam alguns, torcendo para que seja lá quem fosse
não tivesse ouvido o copo cair estilhaçando-se no chão da cozinha.
Apostas
passaram a ser feitas na casa da frente, em que as pessoas sentadas nos degraus
bebendo cerveja propositalmente tentavam, invisíveis, descobrir qual o motivo
da tal forca na varanda.
Usavam binóculos e filmavam com os
seus celulares, procurando uma história excitante que culminasse em suicídio ou
coisa que o valha.
De dia, ao transitarem disfarçadamente
de um lado para outro na frente da casa, nada enxergavam que pudesse refutar ou
concordar com as teses. Nada de corda pendurada durante o dia, nada de vela
acesa, nada de viva alma naquela residência assustadora.
Um ritual satânico foi cogitado; uma
brincadeira de mau gosto para zombar da curiosidade deles também foram citadas
na lista de motivos para aquela cena que se repetia todas as noites.
Virou rotina e os vizinhos foram
perdendo o interesse no jogo; já não se sentavam à noite para observar a vela
tremulando nem a peça de corda que lembrava uma forca.
Eis que uma manhã dessas acordaram com
inúmeros carros de polícia isolando a área em torno da casa e um corpo
pendurado pelo pescoço balançando ao sabor do vento, pescoço quebrado,
asfixiado, morto, suicidado finalmente.
Os vizinhos trocaram olhares e
contaram à polícia tudo o que sabiam sobre a forca na varanda, mas não tinham
uma palavra sequer de conhecimento sobre o homem que tirara a própria vida
daquele jeito, um solitário a mais no mundo, sem amigos, sem família, sem
ninguém.
Na noite seguinte não havia mais corda
na varanda; muito menos vela tremulando naquela casa. Apenas escuridão total e
completa.
Os
vizinhos passaram a conversar e beber como antes, só que agora com a luz acesa,
esquecidos rapidamente do que acontecera do outro lado da rua.
É, as pessoas perderam mesmo a
capacidade de se emocionar...
Marcelo Gomes Melo
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