Os
que gastam bastante tempo durante a vida pensando uma lápide apropriada, com os
dizeres certos, precisam ir além disso! Estão tratando de sua imagem pública,
raios! Deixar as palavras que o eternizarão sob a terra úmida ou em uma tumba
clássica é, no mínimo, displicência.
Todos
sabem, subliminarmente, não é costume comentar sobre essas coisas tétricas em
voz alta, a não ser em círculos mais liberais, que as funerárias apresentam
opções padrão: “Amado pai e marido”; “Esposa fiel e humilde”; “Filho educado e
aluno respeitoso” ... Ninguém ousa
dizer, de pronto, entalhado em mármore para sempre o que realmente pensa: “”
Velho safado, ladrão e burro”; “Vadia imunda traiçoeira”; “Maconheiro bebum
desrespeitoso”... Porque depois de morto todos viram santos, ninguém tem
pecados. Pelo menos na escrita das lápides.
Os
futuros mortos modernos já pensam no que desejam que seja escrito sobre eles,
depois que se forem. Um ascensorista, por exemplo, deixou como último desejo
que escrevessem “Esse foi para o andar de cima”. A mulher do frigorífico, “Finalmente
um lugar quentinho”; um fã do Shwarzenegger, “I’ll be back”, e assim por
diante.
Com
o avançar dos séculos e a modernização das coisas, há mais a ser feito pelo
postulante à vida eterna que ainda tem dúvidas de que terá esse direito. Pensar
com estilo é obrigação, e é aí que entra a empresa “Música para funerais”,
treinada para embalar os visitantes do defunto antes que cheguem à moradia
final. Mesmo os desejos mais inusitados podem ser satisfeitos. Funk, caso o
caixão não esteja fechado; Kenny G., se servirem energético no velório, para
manter os convidados acordados. Forró, se as pessoas forem expansivas, que
gritam o tempo todo em um lamento constante e alto; rock para os rebeldes
resilientes, que querem partir afrontando ao mundo dos vivos; brega, se os
convidados tiverem o mesmo senso de humor que o morto. Sertanejo universitário,
não porque esse é o som apropriado para zumbis. Axé apenas para baianos, que
nunca morrem, viram purpurina.
O
fato é que em tempos de pandemia, até o direito a uma despedida em alto nível
passa a ser levada em consideração, porque todos nascem sozinhos e morrerão
sozinhos, mas em ambas as situações, cercados por quem os amam e respeitam.
Coisa que tem sido proibido para as vítimas do vírus mortal.
Os
versos são importantes tanto quanto a lápide. “Eu vos amo/Me dói partir...”; “Onde
você estiver, não se esqueça de mim”; “O céu vai desabar sobre vocês” ... As
canções definem o que a vida lhe deu e o que lhe tiraram. O quanto você se
divertiu e o quanto sofreu. E se sofreu demais, o quanto aguentou. Ou se a
diversão foi maior, o quanto influiu no seu caminho final.
Tudo
em torno de nós é importante. Tão ou mais importante do que qualquer um. O que
lhe influenciou ou a quem influenciou, também. Vive-se em uma época de pensar
nos detalhes. O tempo todo.
Marcelo
Gomes Melo
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