Rotate4all

PopCash

EasyHits4you

The Most Popular Traffic Exchange
Um pouco do submundo e o livre-arbítrio



Ela estava sofrendo por amor quando entrou em meu escritório. Parecia não dormir há dias e a maquiagem se assemelhava à do coringa. Provavelmente entornara uísque suficiente para embriagar uma cidade inteira, não muito populosa. Aceitou o café e fez careta ao tomar, talvez porque não tinha álcool nem açúcar, e estava quente.
Era jovem, ainda, daquelas que podem fingir inocência para qualquer um com o coração mole e a carteira recheada, mas estava por baixo da carne seca no momento. Deixara-se prender na própria armadilha e se apaixonara, quando acontecia exatamente o contrário. Sempre havia alguém mais esperto.
Ao morder a torrada fez cara de nojo; devia estar sem nada no estômago há dias; algo sólido. De braços cruzados a observei sem demonstrar emoções, gente como ela é muito sensível e ao menor sinal de pena dispara seu arsenal de palavrões e se afasta. Essa viera por livre e espontânea vontade, então talvez ainda pudesse ser ajudada, salva ou afundada na lama, dava no mesmo.
Ela comia em silêncio e eu anotava em silêncio coisas como: “parece não tomar banho há dias, só tem essa roupa”; talvez precise consultar um médico após um banho demorado, roupas limpas e muitas horas de sono.
Não estamos aqui para julgar ou pressionar, só assim o que fazemos pode ser considerado ajuda. Eles pedem e recebem. Se mudarem de ideia depois de limpos, sem sarna ou piolhos, a porta da rua é serventia da casa. Por falta de adeus, tchau. Nem todos querem salvação, querem tirar algum proveito e retornar ao ponto de início, eventualmente. São livres para isso, e ajudamos porque queremos, então...
Treinados por anos nesse ambiente somos capazes de determinar a causa do desespero dessas aves de rapina apenas com um olhar. Aquela era vítima da paixão doentia, que a ilude desde adolescente, e agora a domina a ponto de não ter volta. Enquanto ela come o pão e toma o café, alguém abre a porta e me chama para um atendimento mais urgente.
- Padre, por favor, temos um surto aqui...


Marcelo Gomes Melo
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu feedback é uma honra!

Para ler e refletir

O momento em que não serão necessários

    Dói. E invade destruindo espaços fechados. Abertos. O silêncio dói. Tanto quanto o barulho irritante As palavras malditas, urrad...

Expandindo o pensamento