A
farsa de fim de ano
Dezembro
é quente e deprimente, época de tirar o tapete e realmente encarar tudo o que
foi ignorado, escondido sob ele. Uns preferem fantasiar, fazer planos para o
novo ano, mesmo sabendo que jamais serão realizados e a deterioração de suas
vidas patéticas continuará.
O
fim de ano é simbólico, não existe de verdade, porque os dias seguem lineares;
estourar fogos e usar determinados tipos de roupas é um erro desculpável que,
em vez de energizar, anestesiará a todos os estúpidos que comem ervilhas, dão
pulinhos na água e se empanturram de rabanadas.
A
sequência dos acontecimentos não se altera e luzes coloridas não os salvarão
dos medos, dúvidas e dívidas, servem para distrair e não curar.
O
fim do ano é o fim das burrices repetidas ano após ano? Não, tudo continua a
mesma coisa, o que muda é a disposição e a força das pessoas, que envelhecem,
perdem a energia e começam a vivenciar a triste realidade. Ficam mais rebeldes,
menos políticas, rabugentas e intragáveis, É o que vem acontecendo cada vez
mais cedo, com gente cada vez mais jovem.
Não
há o que comemorar! Lamentar seria mais honesto. Lidar com as perdas, abandonar
os desejos e as promessas, começar a arrancar as farpas do corpo uma a uma,
manualmente, sem anestesia. Manter no rosto uma máscara intransponível, não
emitir sons e respirar com parcimônia.
O
mundo está acabando para todos. Ele continuará fisicamente intacto, fixado no
universo, os seus habitantes, entretanto, acabarão rapidamente, sem chance de
pedir perdão ou se arrepender de algo.
Enquanto
pensavam em manipular a natureza, estavam apenas sendo manipulados por ela;
cada final de ano é um sinal emitido com cinismo e ironia, jamais percebidos,
por causa da inocência gananciosa que empana o raciocínio e os mantém sob
rédeas curtas, morrendo aos poucos, agradecendo pelo sofrimento a conta-gotas,
acreditando em uma esperteza que nunca existiu.
Dezembro
é o mês do declínio, a moradia da depressão, a derrota das crenças e a
interrupção por segundos do que poderia parecer a chegada de alguma paz e
comunhão; pura falsidade produzida para manter o comando e a destruição em
massa como uma coisa normal.
Um
brinde na madrugada e algumas superstições servem para que ninguém perceba que
tudo continua igual, os dias não mudam, a ladeira é a mesma lhes empurrando
para o inevitável fim.
Marcelo
Gomes Melo
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