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O esmero dos pecadores



Esgueirar-se por trás da lua em noites sem nuvens, utilizar-se das madrugadas chuvosas como acalanto para os beijos poderosos entre os lençóis de seda, os ruídos estrondosos como trovões, o brilhar dos olhos como relâmpagos ao se cruzarem, imantados, preenchidos com a urgência dos desesperados pela paz após o desordenado prazer que chega ao limite da morte.
Os encantos que vivem no ar, prontos para serem absorvidos por aqueles destinados transformam-se em perfume ao tocar a pele e espalhar-se lentamente, morno, pelo restante do corpo. É o sinal para o início do jogo. Os olhares, os sorrisos parcelados, os toques acidentais, os recados silenciosos...
A aproximação no tempo certo, cuidadosa, discreta, a troca de palavras, frases inacabadas, pensamentos conectados, e a fúria incontida prestes a sair do controle, ali, entre todos os outros olhares indevidos.
A dança apaixonada sob a proteção das sombras, os arrepios cujo mais quente cobertor silenciará, os suores que banham os corpos sob ar condicionado gelado, verdadeira sauna liberando desejos pelos poros.
O que amantes sabem não deve ser dito a mais ninguém. O que amantes fazem não pode ser visto por ninguém. O que conseguem não é alcançado por ninguém... O trágico é o preço que já sabem terão que pagar por todo esse talento para as artes amorosas. Ambos pertencem a outros. Jamais pertencerão um ao outro, além dos milênios sob os lençóis!
Todo o desenlace é secreto, não é permitido demonstrar qualquer sentimento em público, nem ódio. Os momentos em que estão distantes são os mais longos e torturantes. Os desentendimentos por isso acabam, como sempre, na cama, tentando sufocar todo resquício de dúvida, da forma como se seca tonéis de bebida para matar a sede, mas só é possível inebriar o cérebro, e a sede continua.



Esmerar-se pelo que é justo, o prêmio que os corpos oferecem aos pensamentos não elimina a realidade de que não é permitido querer para sempre e lutar por isso. É impossível não querer para sempre, mas não é possível lutar para que aconteça.
A sombra que protege os amantes é densa e profunda, mas traiçoeira como areia movediça. Quanto mais se rebelam contra as regras, mais afundam e se perdem nos braços um do outro e na imensidão do horizonte, solitários, no fim. Vítimas de todas as dores de amor, corpos marcados por arranhões e hematomas que formam o mapa proibido dos que se querem e se desejam, e satisfazem-se pelo tempo que for possível, equivalente a eternidade.
Então vem a ironia: tudo é destruído, desmorona como um castelo de cartas ao sopro do vento frio. Os caminhos se alargam e tudo o que se enxerga são pântanos no pensamento; o coração enrijece e a separação é inevitável, vencidos pelo que desde o início sabiam não poder deixar acontecer. Apaixonaram-se!
Cruelmente, inevitavelmente, o amor os separou. As expectativas aumentaram, o desleixo tomou conta e os cuidados necessários foram deixados de lado. O acaso parou de protege-los, os mares secaram e o céu ficou cinza.
Petrificados, viraram uma ode ao romance completo, ao amor indeterminado, à paixão fulminante. Estátuas de semideuses do coração alimentado pelas delícias inacabáveis de um paraíso particular.


 
Marcelo Gomes Melo

 

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