Emoções
baratas no banco de trás
O som das harpas
ininterruptamente açoita o meu pensamento com seus acordes perfeitos. E isso é
magnificamente chato!
Ninguém vive em êxtase 100% das horas, todos os dias de
todas as semanas, invadindo os meses e completando os anos, desvairadamente,
sem que isso o torne um desfocado mental. Há que equilibrar as forças do
universo com um pouco de tristeza, de solidão, irritabilidade, mau
comportamento e pensamentos impróprios, tudo isso em doses suportáveis, para formar um ambiente
palatável à sobrevivência.
A nossa espécie é peculiar por causa da inquietude, da
imprevisibilidade. Tudo o que é monótono foge às expectativas porque sempre se
busca o improvável, se deseja o que não se tem, a mudança de postura, de ideias
e de atitudes é constante como a mudança
das estações. Não compreender é o que move a humanidade constantemente, daí a
facilidade em julgar sem conhecer, a tudo e a todos, o tempo todo. E a
preferência pela crítica indiscriminada, pelo destaque aos defeitos em
detrimento das virtudes é algo visível. Talvez porque as desgraças e os pecados
rendam mais diversão, mais conteúdo para resenhas do que elogios e atitudes
louváveis, mesmo porque as belas ações são esquecidas rapidamente por quem as
realizam do que por quem as recebem. E muitos dos que as recebem odeiam lembrar
e consequentemente passam a odiar a quem os ajudou, culpando-os por terem
necessitado e por terem sido retirados da lama. Isso é mais comum do que se
imagina.
A vigília constante é
necessária. Mas os indivíduos entendem essa instrução de maneira errada. Não se
deve vigiar aos outros, mas a si mesmos! Vigiar as próprias atitudes e
reconhecer as próprias fraquezas, pois isso tornará o autoconhecimento mais
fácil, e com isso, a melhora na relação com o mundo.
Uma jovem outro dia, sabiamente destilou: “preciso cuidar
apenas da minha saúde, porque da minha vida a vizinha cuida”. É a definição
perfeita de como se compõe a vida em sociedade. Não importa a classe social, o
credo, a posição política; o que caracteriza o ser humano é a incerteza e a
fragilidade. As gerações enfraquecem sucessivamente e se tornam cínicas ou
crédulas, de acordo com o período em que existem. Por outro lado, algum tipo de
ganho acontece em paralelo para equilibrar as coisas e tornar a vida
suportável, até feliz, muitas vezes.
Nenhum amor precisa ser
eterno, nem a felicidade inacabável; nenhuma dor permanece para sempre. São
constatações. De vez em quando é bom ter emoções baratas no banco de trás de um
Fiat 147, parodiando a antiga canção.
Marcelo
Gomes Melo
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