“La
bendita Kátia”
Levantei do sofá bravo
com a dona da pensão. Saí pisando duro visando comprar pão. Acelerei com raiva
a droga do furgão. Parei num boteco animado, onde pedi uma dúzia de pãezinhos
quentinhos, mas incrivelmente não tinha pão!
Aproveitei para tomar uma pinga com canela, afogar a
decepção. Outra pinga mineira e depois uma cachaça cascavel de saideira.
Dentro do furgão vermelho como os olhos não me esqueci de
sacar a garrafinha do bolso do paletó, sentir o gosto do rum me faz não sentir
tão só. Caminhando em busca do pão, encontrei um supermercado.
Entrei cortando caminho, desviando de coisa alguma. Sem
pão, fiquei louco da vida, tive que ir então, ao corredor das bebidas. Licor,
vinho, vodca, cachaça... Enchi o carrinho e dei graças!
Achei uma caixa grande
de papelão, coloquei as garrafas e um pacote de limão; trupicando com o peso da
caixa, nem sei como cheguei ao furgão.
A caminhada deu uma sede de ouro! Abri a garrafa da branca
do chapéu de couro. Sou um homem de palavra, segurei a chave e fiquei parado,
esperando a porta do meu furgão passar. Abri, entrei, liguei, saí rasgando,
bebendo e cantando.
Jorge Ben Jor, “olha a banana, olha o bananeiro...”; aí
enxerguei o farol fechado. Ou era um disco voador cheio de luzes acesas no meio
da rua, estacionado.
Desviei na categoria, o mundo girando em torno do meu
furgão, escalei a calçada, penetrei numa casa bonita, cheia de portas de vidro,
pessoas correndo, um monte de gritos.
Na pressa só li o começo da placa sobre a porta: “Pani”...
Tarde demais! Bati num balcão, destruí uma parede. Antes de apagar, pensei,
estou no céu! Vi um monte de anjos vestidos de branco, com as cabeças cobertas
por toucas de renda, carregando bandejas.
Acordei do coma dez dias depois, no hospital. A patroa,
aliviada, perguntou o que eu fui fazer destruindo uma padaria inteira!
Panificadora do tio João.
Suspirei desolado, lembrando a perda do conteúdo precioso
da caixa de papelão, e respondi resignado: Querida, fui comprar pão!
“Bendita Katiaça!”.
Marcelo
Gomes Melo
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