Nesgas
de lua apareciam entre as folhas secas de outono sem fim. O vento frio tornava
os seres conformados, um tanto encolhidos, costurados com linha de pesca e
deixados ao relento, de frente para uma paisagem maravilhosa.
Esse
é o modo cruel de mostrar a finitude. Toda a fragilidade de corpos mortais que
murcham, e a alma não lhes cabe mais, precisa expandir-se e se afastar da
opressão de um receptor impuro, imprestável, menor do que ela merece.
É
assim que muitas almas se perdem, enlouquecem e se tornam más por conta dos
seus receptáculos cruéis, fracos, os não-merecedores. O tempo desgasta e corrói
como ácido, em silêncio. O faz até com as pedras, ninguém sai incólume.
Vertigem é o que acomete aos que pretendem ir mais longe e mais rápido do que
os controladores o permitem.
Magnanimamente
o orvalho cobre as folhas e os corpos; enregelados eles têm a sensação de
preservação inútil, mas consoladora, como esperar uma revelação nos últimos
momentos, seja lá o que for.
Buscar
significados em uma folha em branco é melhor, mais confortável do que desvendar
o que já foi vivido e registrado, e com toda a certeza exige originalidade e fá
durante décadas de vida, enganando-se ao acreditar poder driblar o destino,
tornando-se impopular com o espelho pelos pensamentos opostos às atitudes
desleais.
Instabilidade
é tudo o que pode lhe manter desperto quando os luminares do universo caem.
Enquanto as luzes se apagam e a queda do portal é inevitável, ninguém quer
ficar para trás. Atropelam-se, fazem o jogo da morte sem pensar duas vezes. A
sobrevivência não tem lei, a discórdia é a desculpa perfeita entre os pilares
que tombam sem mostrar misericórdia, porque não há nem isso entre os sacrificáveis.
Aqueles que vieram para atuar durante algum tempo e depois despencar na
escuridão infinita, sofrendo diariamente, fazendo sofrer diuturnamente, uma
existência marcada por falhas impossíveis de consertar, por motivações obscuras
que os dominam e às quais abominam, mas não resistem por falta de força, de
poder, ou de vontade. Pela ganância de acreditar que agindo desse modo pode-se
alcançar algo miraculoso.
No
fim, o inevitável. Tornar-se outra vítima no baú do irrisório, ouvindo o tique-taque
compulsivo do fim do mundo.
Marcelo
Gomes Melo
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