Eram
apenas olhos nos olhos em tempos de pandemia, com os rostos cobertos por
máscaras e um boné escondendo os meus cabelos grisalhos. Uma touca colorida mantinha
apenas uma parte dos longos cacheados dela. Os olhos azuis; os meus, marrons.
Brilhavam incontrolavelmente, eu tinha plena certeza.
Distância
regulamentar garantida, juro que ela sorriu sob a máscara, irônica,
desafiadora. Os meus olhos eram quentes embora a minha expressão fosse dura, costume
de vários anos.
Ela
mexeu nos cabelos vaidosamente, o que pareceu um sinal ao qual eu não estava
disposto a ignorar. Ambos em pé, no metrô um tanto vazio. De vez em quando
pessoas cruzavam o nosso caminho por instantes perdíamos a conexão visual, mas
os batimentos do coração permaneciam aceleradas e um certo calor determinava o
nível latente de excitação.
Minuciosamente,
sem disfarçar concentrei-me em seu corpo saudável de pernas torneadas em
destaque pela calça colada. Os seios saltavam sob a blusa fechada, sem decotes,
mas incrivelmente sexy, sugerindo uma respiração ofegante. As bochechas
ruborizadas guardavam certa inocência, desmentida imediatamente pelos olhares
provocantes e as curvas dos quadris extremamente salientes.
Gostei
da maneira como entortou o rosto para o lado, tornando claros a sua atenção em
mim, que não tirava os olhos dela, mas parecia uma estátua, um guarda inglês
que por nada se move, concentrado em seu trabalho. O meu era grava-la em meu pensamento,
cada detalhe, para a próxima vez em que nos encontrássemos em outras
circunstâncias.
Em
sua estação ela saiu relutante, sem tirar os olhos de mim, da mesma forma que
agi, enquanto o metrô se afastava, lentamente, nos distanciando um do outro,
sem nada além de atração e promessas.
Seríamos
nós o primeiro caso de amor platônico em tempos de pandemia?
Marcelo
Gomes Melo
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