Mais uma do fim do mundo
Mariana
entrou na fonte límpida com seu vestido de festa, com seu decote de sonhos, e
eu de fora, observando embasbacado, com as mãos nos bolsos da calça, o paletó
escuro aberto... Naquele instante eu era Mastroianni e ela Ekberg em um filme
de Fellini.
A água pura molhava os seus cabelos
desfazendo as belas mechas douradas, e o prazer que ela demonstrava me atingia
em cheio, correndo por minhas veias e instalando em meu corpo sensações
inimagináveis.
A minha alma flutuava e o perfume que
exalava de Mariana formava nuvens em torno de mim, odores oriundos da natureza,
verdejantes, oxigenados, me encaminhando para uma luz incrivelmente brilhante,
atrativa, que me instigava a ofegar, ansioso, nadando a esmo, no limbo, sem
jamais alcançá-la.
As gotas de suor que pingavam da minha
testa se perdiam no ar, transformando-se em uma enxurrada apavorante,
correntezas e cachoeiras, e depois, lama!
Um estrondo monumental me fez acordar
em minha cama, nadando no seco com as pernas apertadas. Era imperativo correr
para o banheiro! As gotas que se transformavam em cachoeira...
Desesperado parti para o banheiro,
torcendo para chegar a tempo! Um, dois, três passos, a porta aberta e...
AHHHHHHH! Consegui! O xixi salvador que, apesar de ter interrompido o melhor
sonho da minha vida também me proporcionou a fuga da desgraça fatal.
Após
o estrondo e o alívio imediato, com o sorriso dos satisfeitos olhei pela
janela, feliz. O que enxerguei gelou o meu coração com a velocidade de um “uai”.
Uma enxurrada de lama descia assustadoramente em direção da minha casa como u
tem desgovernado.
Abandonei o banheiro e sai correndo,
tentando avisar, aos berros, o desastre que estava em andamento. De um filme
maravilhoso de Fellini para um filme de terror de Wes Craven. Da lama ao caos.
O Brasil sofrendo o terror diário, repetitivo, tanto quanto o terror que
atingiu à França ao mesmo tempo, em proporções gigantescas mesmo que com
motivações diferentes.
Mais uma do fim do mundo, machucando a
autoestima nacional e exterminando a crença de que é possível recuperar-se dos
desatinos, perdendo a fé um pouco mais. Mas o brasileiro nasce com fé
intrínseca ao seu DNA, isso não se pode discutir!
Marcelo Gomes Melo
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