Ganimedes e Belindão (Quando o seu destino é traçado apenas por você)
-
Me conta, Ganimedes, meu brother, o que é que te retrai a esse ponto de ficar
com os ombros encolhidos, o rosto escondido pelo boné, com as garras dentro dos
bolsos como um perdedor profissional?! Que é que é isso, Ganimedes!
- O problema são os lábios dela,
Belindão! Aquele bico de fazer selfie que ela tem e fica me provocando! Aquela
roupa moderna colorida, parece um pirulitão de trocar por garrafas vazias que
ela usa, combinando com a blusa cheia de ratazanas e melancias! Ela me inibe,
Belindão! O que eu posso fazer?
- Você tem que agir, homem! Se está
interessado, não esquente a cabeça, tome mais uma cerveja, pra poder se animar,
já dizia uma canção famosa! Chega junto, Ganimedes, dá aquele olhar 43...
- Belindão, olhar 43 é pra você que é
dos anos 80, eu sou século XXI, já!
- Então qual é a atitude do século
XXI, cara, me conta.
- É baile de favela, Belindão! Vem cá,
cachorra, desmontando peladona, levar surra de chibata, no barraco do bandido,
três oitão cheio de balas e maconha pra fumar.
- Não me admira você não pegar
ninguém, Ganimedes, sem querer julgar... Mas, se é essa a moda chega junto, vai
falando pra menina.
-
São aqueles saltos altos, Belindão! Ela anda como uma minhoca eletrificada no
meio das mesas, bonita como uma bicicleta de pedreiro. Eu fico louco, Belindão!
Não consigo suplantar o temor; ela é inatingível pra mim.
- Rapaz... Causa perdida. Toma uns
trocados, contrata uma amiga. Tem BBB de sobra na noite, amigão!
- Eu quero é a Gracilda, Belindão! É
ela que mexe com os meus neurônios e intestinos. É ela a cabrocha com quem eu
quero dançar o arrocha!
- Então se liga, Ganimedes, se liga
que ela está vindo pra cá. Postura, Ganimedes, peito pra fora, barriga pra
dentro, vamos! Tira o boné, mostra esse rosto horrível pra mina, Ganimedes.
Prende a respiração. Isso!
- Oi, Belindão, oi Ganimedes.
- Oi, Gracilda! Tudo joinha, na
farinha?
- Tudo. O Ganimedes está roxo, nossa!
Ganimedes, paga um açaí?
- Caramba, Ganimedes, caiu no laço!
Respira, respira, você está roxo! Não era pra prender a respiração pra sempre,
não! A Gracilda quer um açaí, meu irmão, você paga? PAGA!
- Por que ele está assim todo torto,
Belindão, está passando mal? Minha nossa!
- Não, ele está bem, Gracilda, os
dentes pra fora encobrindo o lábio inferior, os braços e os dedos rígidos
assim, tortos como se estivesse tendo um ataque epilético é só por causa dessa
sua voz esganiçada danada de bonita!
-
Diz pra ela que eu pago o açaí grande pra ela, Belindão, eu pago. Manda ela ir
na frente que eu sigo no trenzinho.
- Deixa de ser estranho, Ganimedes,
ela está aqui à sua frente, fala você mesmo!
- Traduz, Belindão, traduz, pelo amor
de Deus! A minha voz não sai, parece que há ovos cozidos na minha garganta. Me
ajuda, Belindão, tenho que pegar a Gracilda! É o nervoso, Belindão, é o
nervoso!
- Tá bom, tá bom... Gracilda, ele
disse que paga o açaí pra você. Eu acho que é melhor você tomar dois, pra
engordar esses cambitos. Ah, vai à frente que ele segue sua trilha coladinho.
- Belindão, Belindão, não acredito!
Vou pegar a Gracilda, Belindão! Hoje a taturana entra no vulcão!
- É isso aí, Ganimedes, vai fundo. Vai
logo, cara, está esperando o quê?!
- Minhas pernas não respondem,
Belindão! Estou tremendo, rapaz! O que é que eu faço, Belindão, ela já vai lá à
frente na direção do balcão. Se eu não chegar a tempo outro paga o açaí e eu
perco a chance de xavecar a Gracilda!
- Chama o Toinho, e pega a cadeira de
rodas dele emprestada. Vai perder essa?!
- Mas o Toinho não tem pernas, vai
ficar no chão?! Pelo amor de Deus, Belindão! Eu estou nervoso, estou doidão,
estou espumando pela boca!
- Aproveita e faz a barba, Ganimedes.
-
Não brinca, por favor, a Gracilda já está lá e eu aqui! Parece um jardim,
enfeitando o balcão do bar!
- Um jardim de inverno, não é? Fina e
colorida, de salto alto...
- Belindão, vou lá, vou lá! Pago o
açaí e levo pra sair. Agora fiquei macho! Vou sem medo cantar o funk para
encantá-la. Não me segura, não me segura que eu estou decidido.
- Então vai, brother Ganimedes, faz
que nem a abelha!
- Como assim, que nem a abelha? O que
a abelha faz?
- Vai logo zumbindo na orelha dela.
Zzzzzzzzmmmmmmmm!
- Belindão, não farei algo ridículo e
estranho assim com a Gracilda!
- A escolha é sua. Você é estranho e
ridículo e não pega a Gracilda...
- Quer saber, Belindão... Ela é muita
areia pro meu caminhãozinho. Eu vou deixar isso pra lá, não pode ser verdade;
tenho que estar sonhando.
- Não! Você está acordado, Ganimedes,
está aqui comigo, em um ambiente paradisíaco... Pelo menos a decoração tenta
parecer paradisíaca. E a Gracilda te pediu para pagar um açaí pra ela! Tudo é
verdade!
- Não, não... Quer saber? Estou no
meio de um sonho. Vou voltar para a minha cama que é perigoso sonhar assim. Te
vejo mais tarde, quando acordar, Belindão.
- Ganimedes, volta aqui! Vai perder a
chance com a Gracilda! Ela te quer. Ganim...
Marcelo Gomes Melo
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