O desejo irreparável de confrontar o pecado alheio
Para
confrontar o pecado alheio, os homens e as mulheres de bem precisam exorcizar
os próprios demônios. E para que isso ocorra há que enfrentar a batalha de uma
vida inteira.
Durante esse período probatório o
espelho mostrará a eles o que se recusam
a enxergar diariamente: as suas falhas, os seus deslizes, os seus terrores e as
suas ações inconclusivas.
Os homens e as mulheres de bem tentam
evitar os próprios questionamentos, temem o julgamento superior e recorrem à
velha artimanha de contar com a bondade infinita e justiça inabalável; mas erram
feio ao citar a justiça, pois acham que a definição da palavra é “tudo aquilo
que os favoreça, sempre”, quando na verdade a justiça, por ser completamente
imparcial pode resultar em um desastre para os covardes e para os corajosos, e
todos o sabem muito bem, ainda que apenas por instinto.
Enquanto as suas vidas vão passando,
tediosas, medíocres ou perigosas, os enganos se amontoam como lixo em seu
redor, e as pegadas de lama formam um rastro que não os deixa se esconder;
paradoxalmente, os olhos atentos perscrutam e julgam segundo após segundo,
cruel e invariavelmente, se esquecendo, propositalmente, de olhar os próprios
detritos produzidos pela ineficiência e egoísmo.
Como
confrontar o pecado alheio, então? Quando a existência lentamente se aproxima
do fim, vai tornando perceptível a inutilidade de tudo. A velhice moraliza?
Ninguém tem o poder, o direito nem o dever
de julgar a ninguém, em circunstância alguma, embora continue fazendo
descaradamente, talvez como uma forma mórbida de alento, um jeito de superar as
próprias falhas através do esquecimento, apontando holofotes para os desvios de
conduta do próximo.
É uma maneira rastejante de viver,
fica claro quando se para e pensa, mas ainda não inventaram outra, e o ser
humano se divide entre a glória e o desespero, a falta de caráter e o medo da
morte.
No final de tudo, a volta ao início, o
fechamento do círculo, e todos se veem tentando confrontar os pecados dos
outros desgraçadamente, e ainda assim sem conseguir produzir nenhum efeito
positivo, construtivo, sem alcançar nenhum ganho útil em nível físico ou
espiritual.
Apenas o registro de mais uma vida
vazia desperdiçada de modo incongruente, levando ao limbo. Enquanto isso
disseminam a balela da procura de um sentido para a existência, sem demonstrar
consciência ou sensibilidade sequer para admirar a beleza e perfeição de uma
gota d’água.
Marcelo Gomes Melo
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