E eu era um rei naqueles dias. Nos dias em que ela lavava pacientemente os meus cabelos com xampu e ensaboava o meu corpo suavemente com sabonete líquido cheiroso e percorria com os lábios o labirinto da minha pele, mexendo com os subterrâneos do meu pensamento, linda como uma rainha, fogosa como uma potranca, ágil como uma gata, feroz como uma tigresa.
Como um rei eu permitia que todos os meus sentidos aflorassem e estremecia a cada sopro de vida que ela me deixava sorver, até que fluísse de mim o seu maior prêmio, o que lhe fazia sentir a si mesma a mais poderosa das mulheres, uma amazona incrível que dominava tudo sobre a terra e precisava de um gozo desesperado para lhe fazer completa. O gozo de um rei!
Nada importava além disso. A escolha era dela. Os termos eram ditados silenciosamente por ela, com o seu olhar cor de pedras, tranquilo até que se percorresse as pupilas, o arfar suave, o crispar das mãos em meu corpo, os músculos retesados, inquietos, um prazer que abalava a manhosa feito uma tormenta cruel.
Esse era o momento der irresponsabilidade de uma amazona, sempre focada no poder, na contenção dos sentidos, no esconder peremptório de sentimentos incomensuráveis, os quais eram sinônimo de fragilidade. E a única a qual ela se permitia era esse momento comigo; mesmo assim com a altivez de uma rainha e a convicção de uma guerreira.
Ela sabia. E eu sabia. Um de nós se apaixonaria e quebraria como um galho seco de outono, e com quem acontecesse primeiro o transformaria em passageiro em um trem descarrilado rumo ao eterno. Era um riso que ambos corríamos, e que nos excitava até um próximo passo. Sempre um próximo passo no escuro, notando o abismo sem localizá-lo , sentindo prazeres que o medo aguçava, pensando em quando seria o fim.
Ou se jamais haveria fim. Porque nada importava. Nada se comparava ao nosso reinado entre quatro paredes, em um mundo de dois habitantes.
Marcelo Gomes Melo
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