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“A irmã do salário”


           Uma grande lembrança do bairro nos tempos de criança era o fato de jogarmos futebol na rua, antes e depois da escola, de manhã e à noite, fazendo dois golzinhos de chinelos e jogando com uma bola de capotão, que fazia a alegria da molecada de segunda a segunda. Fazíamos pequenas fogueiras na época de inverno, em frente à nossa casa e assávamos mandioca e batata doce roubadas da chácara do “veio”, correndo o risco de tomar tiros de sal por isso. Não havia perigos noturnos. Ficávamos até as vinte e três horas, e aos sábados até a meia noite tranquilamente, criando fantasmas em uma casa em construção ao acender uma vela coberta por um lençol branco e nos escondíamos para observar a reação dos transeuntes ao enxergar aquela pseudocriatura assustadora em meio a escuridão da casa vazia.
          O “salário” era um garoto da turma, grande dançarino de funk, habilidoso no futebol, irmão na arte de fazer travessuras. O apelido era salário porque se tratava de um neguinho baixinho como o salário já àquela época (sim, um neguinho baixinho, como ele mesmo se denominava, não um afrodescendente com altura reduzida como hoje exigem a falsa correção política). Morava em uma casa em cuja frente fazíamos um dos gols para jogar futebol, e o cômodo principal, que dava para a rua era o quarto da irmã mais velha dele, um verdadeiro avião, inalcançável para os pré-adolescentes que éramos. Bem embaixo da janela da casa azul, ficava um enorme tambor vazio, desses de óleo, abertos e sem nada dentro; nunca soubemos a função daquele tambor, então arranjamos uma para ele: à noite, quando não havia mais ninguém na rua, nos escondíamos no corredor da casa do Antonio e tentávamos acertar o tambor com pedradas, numa competição emocionante, porque quando acertávamos, o barulho era enorme e assustador, portanto tínhamos que correr desesperadamente para não sermos descobertos. A maravilhosa irmã do salário, então, abria a janela, de camisola, furiosa e assombrada, gritando impropérios por ter sido acordada pelo barulho. Nós gargalhávamos para dentro, com as mãos tampando a própria boca. Ninguém nunca descobriu o mistério das pedradas no tambor, muito menos a irmã do Salário!



          Às sextas feiras nos reuníamos na casa de cada um, em rodízio, as onze da noite para assistir aos filmes brasileiros mais sensacionais de todos os tempos, na tevê Record: a Sala Especial. O mais pornográfico que chegamos a ver foi a jovem atriz Vera Fischer nua, no colo do ator Perry Sales, girando em círculos como bobos, impedindo que víssemos qualquer coisa além dos cabelos loiros!
          Só que, no sábado... Ah, o sábado! Começávamos cedo a jogar futebol na rua, e era o dia em que a irmã do salário limpava a casa. Era um acontecimento esperado por toda a semana. Ela colocava a vitrola sobre o tambor colado à janela, escolhia um  disco em vinil compacto da cantora Gretchen (essa mesma cuja filha virou homem e que parece ter sido operada por um médico nazista); ela era um sucesso nacional, com pouca roupa, muitos gemidos e gostosura, cantando (?!) algo que ninguém prestava atenção porque estavam hipnotizados por seu rebolado sensual e delicioso, no volume máximo, e a festa estava completa!
          A sensacional irmã do salário era alta e muito, muito gostosa! Vestia um shortinho tão curto que não cabia em uma boneca Barbie e nos fazia pensar em como conseguia respirar dentro daquilo, ao mesmo tempo em que agradecíamos a Deus pelo talento dela. A blusinha tinha o maior decote da face da Terra, chegava até o umbigo, e ela rebolava igualzinho à Gretchen! Aliás, melhor! Era o alvo de nossas atenções, durante todo o sábado, chegando a nos fazer esquecer o futebol durante os momentos em que ela remexia em círculos, com as mãos para o alto, enlouquecendo-nos completamente, sem parecer perceber qualquer efeito que causasse naquela tropa de garotos abobados, descobrindo a sensualidade do sexo oposto.



           Ah! A irmã do salário seria um mito, hoje em dia. Suas fotos e vídeos se tornariam virais e estariam em todo smartphone de um cara de valor. Ela foi o paraíso na Terra e deve ser imortalizada por isso, como o era nos sonhos de cada um de nós, em uma época em que esse era todo o prazer que teríamos naquela idade; inocente, feliz, marcante.



Marcelo Gomes Melo

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