Os
mortos não envelhecem jamais
A
morte é tratada como um tabu inigualável e inacabável através dos tempos pela
humanidade. A aura obscura e a inevitabilidade do término de tudo o que está
vivo, e de todos os que estão vivos atribuem ao nascimento um acionar
automático do relógio da existência; a partir daí muitos limitam-se a esperar o
fim, outros a aproveitar a vida e outros a aprender como burlar o fim,
revertendo o processo na busca pela conquista da eternidade.
O
que há de comum entre os humanos viventes é a curiosidade, o entendimento, a
vontade de aprender as razões da existência e do seu término inevitável. Todos
têm medo do que desconhecem, o que está abrigado pela escuridão, longe do que
os olhos podem enxergar, causam ansiedade e especulações. Dar asas à imaginação
é algo que faz parte das características humanas; é isso o que especifica
determinadas atitudes sociais na referência aos recém-falecidos, sejam quem
forem.
Quando
alguém “parte dessa para melhor”, um dos eufemismos mais usados para informar a
morte do indivíduo, automaticamente as lamentações e os pêsames tomam conta do
ambiente; as pessoas procuram demonstrar tristeza e contrariedade encurvando os
ombros, crispando os músculos faciais, construindo para si mesmas um aspecto
sombrio, pouco importando se conhecem ou não intimamente ao infeliz. É de bom
alvitre demonstrar todo o pesar pelos vivos mais próximos, e politicamente
correto consolá-los de alguma maneira.
A
sequência disso acontece com as homenagens. Por pior que tenha sido em vida,
por mais malefícios tenham causado, por mais corrupto ou canalha que tenha
sido, a morte extingue os defeitos. Os comentários são sempre os melhores, e
qualidades, mesmo que jamais tenham existido, são citadas com uma convicção
extrema. Parece que todos os que morrem não vão para o inferno, porque são
maravilhosos e perfeitos, abandonando os defeitos na terra para que sejam
herdados por outros. “Deixo a vida para entrar na história...”; parece que o
subconsciente dos vivos gira em torno de algo assim. Buscar algum tipo de
merecimento para garantir a eternidade, mesmo que seja metafórica.
Talvez
seja essa a razão pela qual os mortos não envelheçam no imaginário popular.
Serão vistos para sempre com a idade com a qual deixaram a vida, e sempre em
seus melhores momentos, com ausência de defeitos garantida.
E
os aniversários se repetem ad eternum; sempre comemorando a idade que tinha
quando se foram. O que faz com que surjam novos temas para debate, como o que
se refere aos suicídios de pessoas famosas e jovens que por não suportarem a
pressão preferiram eternizar-se exatamente como eram no momento de suas mortes.
Trata-se
de coragem, loucura ou covardia extrema? Ausência de Deus ou a procura por ele?
O
fato é que os mortos não envelhecem. Zumbis já são outro departamento.
Marcelo Gomes Melo
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu feedback é uma honra!