Entre
o apelido carinhoso e a discriminação
Há quem assuma o
apelido com o qual foi agraciado e o julgue carinhoso e, ainda por cima, melhor
do que o nome de batismo, horrível e constrangedor, fruto de uma verdadeira
maldade por parte dos pais, que misturam nomes, homenageiam ídolos, às vezes
até estrangeiros, santos e sabe-se lá mais o quê. Há quem odeie e ache o
apelido uma forma pejorativa, degradante e vergonhosa, reagindo com impropérios
e violência a cada momento em que o mesmo vem à tona em sua presença.
O povo brasileiro gosta de apelidar, carinhosamente ou não,
e isso tem sido comum através dos tempos. Pode-se contabilizar inúmeros “zóio”,
“bigode”, “magrão”, “cabeção”, “zoreia”, “gordo”, “neguinha”, “gaguinho”, “japa”,
“ceará”, “baiano”, “mãozinha” e muitos outros; todos os donos cientes e
respondendo prontamente às respectivas alcunhas sem nenhum tipo de mal estar ou
problemas de baixa estima.
Muitos fazem questão de incluir o apelido oficialmente ao
nome da certidão tencionando obter vantagem política ou artística. Músicas
foram feitas exaltando ou não personagens famosos através de apelidos, como nas
cantigas de escárnio e maldizer no gênero lírico da literatura romântica.
Apelidos procuram destacar determinadas características, ou
ironizar a falta delas; tratar com extremo carinho (em português geralmente
utiliza-se o diminutivo), ou com respeito, indicando poder (acontece no
aumentativo). Isso faz parte do estilo de um povo. Sorrir, expressar-se usando
criatividade pura, muitas vezes até contrariando as regras gramaticais vigentes
( houve um jogador de futebol brasileiro cujo apelido continha, na mesma
palavra, sufixos no aumentativo e no diminutivo: gatãozinho).
De uns tempos a esta parte, no entanto, a utilização de
apelidos ganhou um risco muito grande, que é a sombra da discriminação. Em
tempos de intolerância social, racial e total, todo mundo, até os donos dos
apelidos, precisam policiar-se, pois há uma linha tênue separando o carinho e a
brincadeira do insulto passível de processo e punição.
Qual é o limite para não exagerar e ser crucificado por
todos? Como saber quando é uma forma de mera referência ou quando a intenção é
humilhar, desmerecer, diminuir e destruir a autoestima. Geralmente a utilização
dos apelidos acompanham vários outros
sinais que podem ser usados para compreender a intenção do interlocutor, como a
tonalidade da voz, o gestual e seus maneirismos físicos; mas isso é tudo muito
subjetivo.
Na dúvida todos estão preferindo chamar o amigo pelo nome
de batismo, por horroroso que seja e sem se importar que o amigo abomine a
própria graça, em vez de arriscar receber um processo seguido de prisão.
Não há mais “Pelé” ou “Garrincha”, apenas jogadores com
nome e sobrenome; só falta agora extinguirem palhaços de apelidos “Bozo” e “Carequinha”,
e chamá-los pelos registros em certidão de nascimento. Estará a intolerância
vencendo a batalha? Sinal dos tempos, amigos, sinal dos tempos.
Marcelo
Gomes Melo
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