Morrer de amor parece ser inevitável
Era
plena madrugada quando ela me ligou. Fiquei parado olhando a tela do celular,
em dúvida pela primeira vez entre atender ou ignorar.
Tratava-se de uma decisão difícil,
porque quando ligava àquela hora devia ser algo importante. Ela jamais dizia,
mas a minha função era distraí-la e aliviar o peso da angústia que a estivesse
consumindo.
No dia seguinte trabalhávamos juntos,
como parceiros, sem tocar no assunto da madrugada. Muitas vezes horas de
silêncio, um silêncio cúmplice que só dizia respeito a nós dois. Nunca parecia
importante no dia seguinte; parecíamos restaurados física e mentalmente.
Coisas do amor, diziam à boca pequena
nossos amigos do trabalho, sempre individualmente, jamais enquanto estávamos juntos.
Se éramos namorados ou amantes? Não!
Sequer trocamos um beijo, embora certos olhares fugissem ao nosso controle e
equivalessem a um orgasmo, nos fazendo parecer hipnotizados. Depois voltávamos
à realidade e uma piada cortava qualquer clima que pudesse ter surgido.
Éramos íntimos sem dividir as
tristezas ou alegrias, demonstrávamos confiança um no outro sem aprofundarmos a
nossa vida particular. Tínhamos a melhor relação superficial já vista, a mais
platônica do universo.
Para todos que nos rodeavam parecíamos
os amantes mais ferozes e discretos da humanidade. Talvez, em nossos sonhos
mais recônditos pensássemos isso também.
Ela cuidava das minhas dores, era
carinhosa e atenciosa, gentil o quanto era possível. Eu a arrancava do mau
humor sendo sutil e ousado, isso nos fazia um casal?
Até
que as costas das nossas mãos se roçaram e o calor de seu corpo alcançou o meu,
e vice-versa. Segundos pareceram séculos e nossos olhos se misturaram, nossos
pensamentos se entrelaçaram e, garanto, não estou louco, garanto, fizemos amor!
Fizemos amor em um plano além do
físico e isso se imiscuiu em nossos pensamentos desesperadamente!
Por isso a hesitação em atender ao
telefone. Passaríamos ao plano físico, real, e o medo que compartilhávamos era
um só: morreríamos de amor?
Marcelo Gomes Melo
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