Ela rasgou as minhas roupas e tocou fogo, atirou a minha coleção de relógios caros pela janela, quebrou os meus óculos, destruiu os meus computadores e celular. Aos gritos e soluços me expulsou de casa prometendo uma guerra judicial que me faria perder tudo. O que tivesse e o que não tivesse. Tudo tinha a ver com dinheiro. A intenção brutal dela era acabar com a minha vida como cidadão, impor uma humilhação que me destruísse socialmente e me transformasse em um monstro para os meus próprios filhos. Nossos filhos. E não, ela não me deixava perguntar a razão, urrava e quebrava tudo, acusava e chorava como uma corredeira, sem nunca dizer claramente o motivo.
Atônito, fiquei observando o show de horrores promovido sem embaraço por ela. O que teria causado tal ira? O que um homem como eu, por pior que parecesse, poderia ter feito para ser dizimado da própria família por alguém com quem dividira metade da vida?
E então, pela minha mente passou ponto a ponto a nossa longa história. Do início, na Universidade, trocando olhares e sorrisos. A atração jovem exposta para o mundo inteiro, quando se pensa um no outro como em um mundo à parte, e os encontros são como rituais nos quais se quer demonstrar apenas as qualidades um do outro, como se não houvesse defeitos.
Essa dança duraria algum tempo, porque enquanto nos conhecíamos a tendência era misturar delícias do amor com episódios mal-humorados, brigas bobas, escolhas surpreendentes e preferências diferentes. O surgimento das falhas que nos separaria seria maturado, tolerado, mas nunca superado.
Enquanto casal saberíamos se tratar de equilibrar uma convivência pacífica dentro dos limites que diminuiriam a paixão, envolvendo em uma complicada equação, filhos. Bençãos que separariam um pouco mais o casal que acreditava ser só. O ódio apareceria em breves instantes, rechaçados rapidamente, mas deixando marcas como um chicote.
A parte econômica familiar sofreria com os comentários de cada família, enevoando os pensamentos, incutindo desconfiança entre duas pessoas que antes sorriam juntas. Atitudes violentas e invejosas abriam covas no relacionamento, e um de nós iria surtar em algum instante, e o arrependimento não seria suficiente para reaver o que tinha de bom. Melancolia e infinita tristeza se manifestaria sem que fosse percebida, pairando no ar como entorpecente, causando insônias, silêncios e ofensas desnecessárias, até que o ponto primordial acontecesse. Aquele descrito no início.
A mim restava lutar uma luta sangrenta, mortal, esquecendo quem éramos, ou me retirar em silêncio para uma vida arrasada, mais um frequentador de botecos bebendo para lembrar de esquecer que nada permanece perfeito, simplesmente porque essas falhas modificam os rumos de uma existência linear, incluindo surpresas para apimentar uma vida curta e moldável.
O motivo, jamais saberei. Você jamais saberá, ninguém jamais saberá. Acontece sempre e se repete ad eternum, geração após geração. Viriam cinema e teatro, e os chamam tragédia.
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