Ela
não costumava se dirigir a mim pelo nome, o que em si quer dizer que deseja
evitar qualquer interação social, mantendo uma distância regulamentar mais do
que radical, deixando claro ser um estorvo a comunicação, mesmo sendo
unicamente profissional.
Não
fazia isso com maldade, apenas frieza, não se pode obrigar alguém a gostar de
você, o que ela podia fazer era oferecer o mínimo de educação. Quando se distraía
e falava direto comigo, sequer cruzávamos os olhares. Senhor era o mais
utilizado, com respeito gelado, uma muralha do norte no Jogo dos Tronos,
intransponível e mortal.
Eu
não me importava e nem demonstrava estranheza, usava o seu primeiro nome e
costumava ser conciso e genial, tão distante quanto achava que ela podia
querer. Nossas conversas eram escassas, profissionais, e em meio a uma grande
equipe de profissionais. Jamais tivemos oportunidade de conversar sozinhos.
Caso me pergunte o
porquê, não faço ideia! Nunca houve motivo aparente, apenas não
éramos
escolhidos para qualquer tipo de amizade, ou seja, lá o que fosse. Também
não
fomos sorteados para sermos inimigos implacáveis. Isso deve acontecer com
diversas pessoas ao redor do mundo.
Universos
paralelos jamais destinados a se cruzar em algum momento, por algum motivo.
Conviver
em um ambiente de trabalho, discutir ações eficientes em conjunto sem jamais
cruzar um olhar, raramente uma frase curta direcionada exclusivamente...
Realmente
hoje vivemos em tempos estranhos, nos quais as pessoas agem diferente do que
eram antes e ficam cada vez mais desconfiadas, distantes, incapazes de
interagir sem a máscara social, sempre se esforçando para demonstrar quem são,
fabricando um lado bom irreal, deixando os verdadeiros bons e velhos sentimentos
de verdade enclausurados, enterrados por camadas grossas de falsidade variada,
como arma poderosa apenas para sobreviver nessa selva assustadora, cruel e
letal para cada um; e aumenta à medida em que o tempo passa e a experiência
deixa de significar algo digno de respeito e medalhas e homenagens, para
significar exclusão social, desrespeito e insistência para que saiam do
convívio geral e se recolham no cemitério dos inúteis. Abrindo espaço para
seres jovens totalmente sem noção hierárquica, sem empatia, guiados única e
exclusivamente por dinheiro e poder.
Um
dia ela se descuidou, a guarda caiu e se dirigiu a mim pelo primeiro nome,
informalmente. Provavelmente por distração. Quando percebeu, nossos olhares se
cruzaram e aqueles segundos me mostraram o que ela carregava no coração e nos
sonhos.
Quando
pronunciou o meu nome, imediatamente deixei de ser apenas movimento e virei um
pássaro azul que converte pedidos em realidade. Dos lábios dela brotavam flores
e perfume. Nesses tempos tudo pode acontecer.
Marcelo
Gomes Melo
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