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Alcançando o amor tardiamente



        Antes que eu acorde tenho que lhe dizer da minha vida. Sonhos importantes nos quais você está incluída com importância máxima e hesitei bastante antes de tomar a coragem dos inalterados mentais para confessar o que sinto sem temor de rejeição.
          Antes que eu desperte devo falar dos momentos de insônia e insegurança que me fizeram sofrer por ausência de atenção de sua parte, embora você notasse a parca existência de um ser humano sem sal, desprovido de atrativos suficientes para fisga-la e ganhar o prêmio máximo que seria o seu bem querer maravilhoso.
          Em meus devaneios lisérgicos me incomodo por não segurar as suas mãos macias e, olhando no fundo dos seus belos olhos declarar a paixão que me consome desde os tempos idos, quando madrugava pelos jardins em busca da flor perfeita para enfeitar os seus cabelos, mas acabava sentado à beira da cerca, mudo, empedernido enquanto a flor perdia o perfume e eu as esperanças.
          Vê-la passar tão alegre refazia-me a alma e acalentava a motivação em mim, então admirar os seus passos cheios de vida revigorava o meu ser e me faziam sobreviver a mais um dia de solidão.
          Veja, não me queixo em momento algum por você  se manter à distância, não me dignando a atenção que daria a um cãozinho de rua, um afago, um resto de olhar pelo canto dos olhos que resvalou em um amigo e sobrou gratuitamente para o admirador imóvel e atento que sempre fui. Culpo a mim mesmo, um homem capaz de ser invisível até nas circunstâncias mais atrozes, infeliz que sou, sem sorte que devo ser.



        Agora que finalmente estamos próximos me sinto leve, estranhamente desinibido, feliz por poder compartilhar com você essa minha paixão por você. Posso sentir o seu carinho e cuidado, os seus toques firmes e respeitosos em meu corpo conspurcado pelas atitudes nocivas que tomei durante a vida, justamente por falta de um par cuidadoso que me fizesse enxergar bem as coisas. Alguém como você.
          Antes de voltar a mim e retornar àquela vidinha opaca quero confessar o meu amor decano que muitas vezes me impeliu à beira do penhasco para gritar os meus medos e necessidades, sem conseguir pronunciar sequer uma frase. Mudo, soterrado em meu mundo de pensamentos.
          E agora posso lhe perguntar pelo menos o seu nome, esticar a mão para tocar o seu rosto, me sentir no paraíso!
          Parece ter demorado um século, mas agora no ocaso das minhas percepções contemplo a justiça realizada por uma existência de expectativas. Eu só queria lhe dizer...
          - Esse cadáver está pronto, Armando, já o preparei para o velório. Até que ficou apresentável, meio sorridente!
          - Boa, Elza, vou leva-lo para a sala principal, na qual receberá a última homenagem dos parentes. Hoje você será a estrela, amigão!
          Elza! O seu nome é Elza! Vou acordar, Elza, me apresentar e tentar fazê-la feliz pela eternidade! Oh, para onde estão me levando? Não! Elza! Não para longe de você, meu amor! Vamos dividir a moradia, Elza! O paraíso é logo ali!
          - Nossa, Armando, esse defunto que você está levando se afastou e eu senti um arrepio! Cruz credo!



Marcelo Gomes Melo

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