Oasis das mulheres alcoolizadas
As
mulheres bêbadas não recusavam uma boa talagada de cana. Moíam pimenta
malagueta para temperar o palmito, o tira-gosto; fumavam cigarro sem filtro e
cheiravam água sanitária. Reuniam-se diariamente, à tarde, no covil que
construíram especialmente para esse propósito e planejavam a semana das
respectivas famílias ao sabor das bebidas mais fortes do planeta.
Acorrentavam os filhos logo após
chegarem do colégio e entregavam a lista de tarefas vespertinas: lavar a louça do
almoço, limpar a cozinha, espanar os móveis... Algemados, sem chance de usar o
smartphone, fora do alcance do computador e da televisão. Seriam liberados
pouco antes da chegada dos pais, no fim da reunião etílica das mães.
Degustando cogumelos e sorvendo uísque
misturado com saquê eliminavam a ansiedade de viver nessa época contraditória
cheia de posições incoerentes e atitudes neurastênicas que destroem regras e
impõem dogmas insustentáveis, terríveis.
Com a voz pastosa e o sorriso
desnecessário dos alcoolizados emborcavam copos e copos de pinga e
desembaraçavam problemas familiares como contas a pagar, compra de móveis
novos, verba para o shopping e economia de dinheiro para viagens nos feriados,
aceitando acordos, aparando arestas e combinando ações de controle que
manteriam a ordem dentro de cada casa e no condomínio fechado em que todos
convivem harmoniosamente.
As mulheres bêbadas se permitiam fugir
ao lugar comum atual, que é ceder o comando a quem é mais jovem, entregando
todo o poder de decisão a quem não tem experiência ou conhecimento de vida
suficientes ainda, e segue regras criadas pela televisão, mesmo que vão contra
os princípios legais e morais.
O
álcool era fator de união e resiliência, porque quando a euforia as tocava, se
rebelavam a seu modo contra as famílias desajustadas por confiar e seguir as
modinhas determinadas pelos meios de comunicação, que criaram um zoológico
humano vítima das piores experiências sociais.
À noite, quando os maridos chegavam
tensos e extenuados da labuta diária, os recebiam cheirosas e tranquilas, com o
jantar pronto e boas notícias, aliviando o peso da vida em um curral imenso,
lotado de seguidores hipnotizados, contestadores ineptos e amalucados.
Do outro lado, todos apontavam o gasto
enorme com álcool daquelas senhoras, e as reuniões subversivas de todas as
tardes. A cada ângulo de visão, um julgamento; a cada atitude diferente, uma
crítica; mas que elas estavam se dando bem no desenvolvimento dos filhos e
marido, ah, sim, estavam.
Marcelo Gomes Melo
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