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O crime do creme

                                       
 

                                           O crime do creme 

  
 
 

Uma vez por mês, no pub daquela cidadezinha, frequentada por todos que se conheciam como frequentadores assíduos. Uma vez por mês ele entrava pela porta de vidro, descia a escadaria de madeira e cumprimentava a todos os presentes, discretamente se dirigia à mesa do canto, para duas pessoas, de onde era possível visualizar a rua, já que o bar se encontrava abaixo da rua, como um porão com vista para as pessoas dos pés à cabeça, nessa ordem. Jazz rolava baixinho, incidentalmente, enquanto os frequentadores trocavam palavras entre si, sorriam de casos rotineiros. Ele era incluído nas conversas, então sabiam que era biólogo, uma espécie de cuidador de plantas, e morava em uma fazenda próxima, sozinho, há mais ou menos um ano. Era muito discreto. Sorria. Informava muito pouco.

Creme. Era a sua preferência. Um café com bastante creme, que misturava como um ritual, e sorvia quase que religiosamente, em silêncio, olhando para a própria mesa. Levava em torno de quarenta minutos até que terminasse a bebida. Respirava fundo, dirigia-se ao caixa e pagava sempre em dinheiro, com um sorriso gentil e uma palavra de agradecimento. Saía por volta das 23h00, despedindo-se dos presentes, desaparecendo como chegara, silenciosamente. Agora só retornaria dali a um mês, expressamente.

O creme sempre era reposto pelo gerente, garantindo que nunca faltasse para o cliente tranquilo e discreto.

Mais um ano se passou e ele frequentou o pub por doze vezes. Bebera doze cafés expressos com muito creme.

Eis que no decorrer do terceiro ano mudou a gerência do pub, e as coisas mudaram. Os preços subiram, inclusive do creme, e a quantidade diminuiu. Todos perceberam a mudança de tratamento. O jazz aumentara de volume e os clientes de sempre foram diminuindo.

O solitário ainda frequentava uma vez por mês até a metade do ano, depois começou a faltar, o que foi notado pelos poucos que ainda apareciam normalmente.

O creme no café era muito importante. O aumento de preço não era acompanhado pelo aumento do salário. A dificuldade para o consumo aumentava sem piedade, causava problemas para quem levava a sério os rituais, para quem se alimentava regularmente, idem. O governo estava matando os cidadãos de fome, testando a sua religiosidade e fidelidade.

O solitário voltou ao pub apenas no dia de natal. Estava macambúzio, não havia nenhum frequentador conhecido, nem jazz tocando. Agora era uma música eletrônica estridente e as pessoas se obrigavam a falar alto, não havia conteúdo no que diziam, falavam para ouvir a própria voz.

Ao pedir o café, a surpresa: não acompanhava o creme. Ele questionou em voz quase inaudível, a resposta foi desrespeitosa e evasiva. Bebeu um gole do café. Não conseguiu terminar. Abriu a pequena janela que dava para a rua acima. Ninguém pareceu notar. Pagou. Olhou tudo em torno como se fosse uma despedida. Saiu, não havia de quem se despedir, não havia mais creme.

No dia seguinte as manchetes do jornal informavam desesperadamente: “Um pub lendário havia sido destruído por volta de 23h00, no centro da cidade. Granadas foram atiradas através das janelas, em pleno natal. Ninguém percebeu por conta do som alto e das conversas fúteis. Nada sobrou. Tudo foi pelos ares. Não havia pistas de quem causara tamanho caos e muito menos o motivo.

O solitário nunca mais foi visto. O ritual do café com creme permanecerá um mistério para sempre.

 

              Marcelo Gomes Melo

05/06/2025



 

 

Chimpanzé on crack

 

 

 

- Minha nossa, o que aconteceu?!

- Nada... Me ofereceram cem pratas para sair no tapa com um chimpanzé.

- O quê?! Como algo absurdo assim poderia acontecer?!

- Aconteceu. Era isso ou trinta balas no corpo... Não estou pronto para encontrar Jesus.

- Sair no tapa com um chimpanzé?!

- Fizeram o chimpanzé fumar muito crack. Deram uns choques nele. Ficou furioso, enlouquecido.

- Onde aconteceu isso, pelo amor de Deus!

- Em um container, lugar incerto e não sabido. Só os ricos apostando, assistindo através de câmeras infravermelho. Dentro do container só eu e ele. Estava escuro. Uma luz fraca piscava de vez em quando. O chimpanzé era mais veloz do que o Barrichelo, e brigava como um herói vingador. Estava formado para o ódio, pulava do teto para as paredes, guinchando como um cobrador de dívidas funcionário de agiota. Deu o primeiro golpe no meu olho, com a mão comprida.

- Entrou desarmado?!

- Deram o direito a escolher uma arma apenas.

- Você escolheu?

- Claro. Um par de luvas de couro.

- Quê?!

- Eu preciso das mãos para trabalhar, é necessário protegê-las. O chimpanzé portava uma foice.

- Minha nossa!

- Ele batia aleatoriamente com a foice, tirando faíscas das paredes. Quando me acertou outra porrada de mão aberta, prendi a respiração e soltei-lhe a pancada no cotovelo, tentando tirar a força do bicho. Em seguida soquei o corpo, como pude, com o máximo de força. Ele me mordeu, arrancou um naco de carne do ombro. Acertei uma cabeçada na cara dele, dura como ferro. Ele me batia a esmo.

- Como escapou vivo?

- Tracei uma estratégia. Não apagar enquanto era detonado, soca violentamente de volta, até pegar a foice.

- Como escapou vivo? Pegou a foice? Quanto tempo durou essa carnificina?

- Umas duas horas. Coisa feia.

- Conseguiu pegar a foice?

- Não, mas açoitei o pescoço até ele tropeçar. Caiu sobre a foice. Esmaguei as costas dele com botinadas. Chutei até que os guinchos pararam. Abriram o contêiner, após minutos de silêncio que se seguiram. Pra mim foram anos. Eu estava lá, ensanguentado. Em petição de miséria. Vivo. Cem pratas garantidas.

- E o chimpanzé?

- Pelo que sei está em coma. Pagaram o hospital, além das cem pratas.

- Vão salvar o chimpanzé também?

- Claro, ele faz parte do show.

- Que loucura é essa? Quem faz essas coisas hediondas?

- Se eu lhe contar você terá que enfrentar o crocodilo... Arruma um conhaque. Uma garrafa.



 



 

        Trecho do livro “Espancador: como ganhar um bilhão de dólares usando a força do pensamento”, disponível em breve.

 

                         Marcelo Gomes Melo

Sobre de que o tempo trata


 

Chore, não porque o queira, mas porque é necessário

Expurgue através das lágrimas esse sofrimento maléfico

E indiferente que lhe corrói a alma

 

Alimente os seus neurônios com a eletricidade estonteante

Que transforma em cores quentes o calor que você sente

Nada acontece além do inevitável

 

A curva à sua frente, escura e indecifrável

É o aviso de perigo que é preciso superar

De alguma maneira, para atravessar de fase

 

Alcançar outra montanha na qual se pode

Visualizar o paraíso

 

A loucura é uma parte da maleta que esconde

A realidade caminhando em suas mãos

O conteúdo é discriminável

Papel, dinheiro, documentos importantes

Para você ou para alguém. Ou nada.

 

E o nada é a melhor representação da felicidade

Não diga nada, não faça nada, não espere nada

De alguém algum

 

More nas lágrimas que escorrem

Escaldam e aliviam

É disso que trata o tempo

 


 

Marcelo Gomes Melo

Para ler e refletir

O crime do creme

                                                                                     O crime do creme          Uma vez por mês, no pub da...

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