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O Arauto da destruição – Parte final
A saga do Arauto destruidor de países e contaminador de sociedades é apenas ficção. Qualquer semelhança com fatos reais ou parecidos é mera coincidência. Daqui pra frente apenas os Devastadores da idade moderna.

         Manuel Diego se adaptou ao frio e à rigidez dos soviéticos. Ganhava competições de ingestão contínua de vodca por dias a fio tranquilamente; aprendeu artes marciais socialistas e infiltrou-se na política nuclear no auge da guerra fria.

          Quando souberam que Manuel Diego havia adquirido mísseis nucleares no mercado negro, levaram-no aos porões da KGB e do Kremlin para interrogá-lo e o machucaram com as piores torturas soviéticas já inventadas. Mas ele resistiu. Resistiu e devolveu a tortura à altura, cantando em altos brados pérolas do sertanejo universitário 24 horas por dia até que os torturadores capitularam e o amordaçaram. Insuficiente, porque através dos olhos ainda lembravam-se das amaldiçoadas músicas, então optaram por vendá-lo também.

          Os soldados soviéticos o deixaram em uma prisão mista por uns dias, enquanto pensavam no que fazer com ele. Temiam matá-lo e depois terem que conviver com o seu fantasma para sempre! Manuel inventou uma bebida alcoólica mais forte do que vodca, com batatas, pimenta malagueta e gás encanado, capaz de derrubar mamutes. Bebendo com uma lésbica de Leningrado durante uma semana sem interrupção, jogando baralho, acabaram transando violentamente. Conseguiram fugir do local dias depois, com a posse de mísseis nucleares poderosíssimos. O plano? Acabar com a União Soviética como a conheciam, transformando-a em dúzias de novas nações, faturando bastante dinheiro e adquirindo poder absurdo durante a transição.

 

          A lésbica, forte como um touro, lutadora de sambo, 1,85m de altura e cem quilos de músculos com a ferocidade de um tigre viciado em crack, quando descobriu que estava grávida se tornou um trem desgovernado de ódio e partiu para cima de Manuel Diego disposta a destroçá-lo com uma marreta em uma mão e uma faca de destrinchar hipopótamos e jacarés, afiadíssima, na outra. Lutaram o equivalente a 30 rounds de luta livre, vale tudo, sem que ninguém tivesse a coragem de separar. Manuel venceu a batalha quebrando-lhe os dois braços em três partes cada e as duas pernas, mas teve a clavícula deslocada, um dos punhos macetados, inúmeros cortes profundos pelo corpo e uma concussão cerebral que o deixou meses na UTI. Precisou, nesse período, transplantar o fígado.

          Embora tentasse suicídio por 18 vezes no período de gestação, a lésbica não teve sucesso. Foi obrigada a dar à luz a Manuel Fernando Lulovitch, um bebê afetado psicológica e fisicamente por todos os excessos cometidos pela mãe, inclusive a rejeição contra ele.
          Lulovitch cresceu observando os meandros políticos da União Soviética, e a participação dos seus pais no processo de extinção dos países da união socialista, o que rendeu ainda mais poder e dinheiro para a família.
          A Rússia, a mais poderosa das novas nações pós-separação decretou o exílio de Manuel Diego, sua parceira lésbica e o jovem Lulovitch para a Sibéria, todos com algemas nos pulsos e uma bola de ferro em um dos tornozelos, com a missão de quebrar pedras pelos próximos 50 anos.
 

          Lulovitch cresceu nesse clima de frio extremo, sem ver ou sentir o sol, apenas neve e escuridão. Ele era o espécime mais curioso da família, física e intelectualmente. Alto, forte, cabelos brancos e compridos; pele rosada e olhos brancos, Lulovitch era albino. Parecia uma estátua de gelo, mal murmurava uma frase inteira por entre os dentes. O único sentimento que conhecia era ódio. Odiava aos pais e não sentia absolutamente nada pelo resto dos seres com os quais convivia através dos anos na Sibéria, os bandidos mais perigosos do mundo, que se tornaram uma “família” sob o comando de Manuel Diego, o capo siberiano do que ficou conhecido como a “Máfia do gelo”. Mesmo dali, o “portugaleiro”, português brasileiro mais internacional já conhecido comandava ações de terror pelo mundo. Dizem as más línguas que faturou alto treinando os soldados de Bin Laden na arte de morrer sem sentir dor; as línguas geladas comentavam à boca pequena que vendia urânio para os chineses, iranianos e iraquianos.

          Lulovitch cedeu DNA para a produção de vírus letais que visavam banir continentes do mapa iniciando a batalha biológica mundial. Só aos trinta anos de idade foi autorizado pelo pai a sair da Sibéria com a missão de espalhar o terror pelo mundo. Em um trem cargueiro cheio de africanos, era o único que destoava, pela cor e pela atitude. Foi a primeira vez que viu fêmeas da espécie, já que até os trinta aprendera os artifícios sexuais transando com ursos polares, baleias, focas e pinguins.
          Manuel Fernando Lulovitch comeu muitas africanas naqueles vagões até chegar ao continente africano, local de clima completamente diferente ao que estava acostumado. Foi lá que aprendeu a usar óculos escuros e cobrir o corpo inteiro de tecido leve e branco de dia, e preto à noite. Comprou um chapéu idêntico ao de Indiana Jones, e passara a usar continuamente.

          Durante sua estadia nos países islâmicos passou a ser temido e apelidado de “o capeta transparente”, pela maldade, frieza e cor da pele. Ganhou dinheiro no mercado negro contrabandeando carne de porco; para não ser eliminado pelos fanáticos religiosos aos quais treinara decidiu partir para a Índia, onde passou a organizar churrascos matando as vacas sagradas  e requisitando cientistas indianos para realizar experiências aterrorizantes envolvendo alienígenas. Lulovitch queria realizar mais coisas do que os norte-americanos, quando, no pós-guerra mundial contrataram os cientistas nazistas para continuar a fazer as experiências medonhas que fizeram para Hitler.
          Na Austrália, com quarenta anos e ódio pela vida intacto, Manuel Fernando Lulovitch teve um filho com uma anã aborígene, e sem emoção alguma informou à mãe que o levaria ao Brasil, onde teria participação política decisiva nos anos vindouros. Quando a mãe esboçou uma reclamação, ele a estrangulou usando apenas uma das mãos; jogou o filho dentro de um saco de estopa e pegou um jato particular. Destino: Brasil.
          Vinte e quatro horas depois pousou no nordeste brasileiro, tomando contato com o império da família na área da corrupção e da lavagem de dinheiro. Para a área alimentícia das empresas da família, Lulovitch contribuiu com uma versão light do que comera nos vagões africanos, além das mulheres: feijoada. A diferença é que seu invento foi uma adaptação do original; feijoada light, com feijões brancos, pedaços de mandacaru, caroços de manga e castanha de caju em vez de carne.
          No nordeste o filho cresceu bebendo cachaça na mamadeira e comendo carne de jegue com pirão e rapadura. Aos doze anos aprendeu a fumar charutos cubanos e a brincar com a peixeira, espetando-a entre os dedos da mão espalmada sobre uma mesa de madeira com a maior velocidade possível, bêbado de cair, e com excelente destreza. No processo acabou por perder um dedo, mas virou expert no manejo da arma branca.
          Aos dezessete perguntou ao pai pela mãe. Foi a primeira e a última vez. O pai contou a verdade. Estrangulara a sua mãe porque ela não servia para nada.
          - O senhor é cruel! – Lulinha retrucara, sem emoção na voz, sem parecer horrorizado ou surpreso.
          - Cruel foi sua maldita mãe, que não lhe abortou – foi a resposta gélida do pai, sem sequer desviar o olhar para enxergar o filho. Lulinha jamais perguntou pela mãe.
          Um dia foi retirado de um forró no qual arrasava, conhecido como Lulinha nove dedos, o terror da terra vermelha; estava suado de tanto dançar de alpercatas, levantando o poeirão no chão de terra, ao som do triângulo e da sanfona, comendo buchada e derrubando barris de cachaça. Era o dia do seu aniversário de dezoito anos.
          O pai requisitara. Era uma ordem. Lulinha agora era um homem macho maxixe doce, plenamente treinado pra seguir seus passos e buscar o enriquecimento sem precisar da família. Naquela noite mesmo seria despachado para São Paulo em um pau de arara, com a roupa do corpo e uma trouxa amarrada num cabo de vassoura contendo farinha de mandioca, rapadura e cigarros de palha. No bolso, dinheiro suficiente para sobreviver por um ano. Lulinha não disse nada. Não queria morrer nas mãos do pai.
          Antes de se afastar, o pai murmurou sem olhar para ele:
          - Lulovitch, amaldiçoado safado, vá para São Bernardo e mude o destino desgraçado desse país.
          E ele foi.


Marcelo Gomes Melo

O Arauto da destruição – Parte dois

          Flortônio foi o primeiro bissexual assumido da Argentina e Paraguai, quando foi para esses países negociar; carne argentina para importação e iniciar uma ponte amistosa com os paraguaios com o intuito de faturar alto com a mão de obra guarani que copiava produtos europeus como espelhinhos e pentes à perfeição para revender mais barato.

          Na Argentina usava o sexo masculino e teve um caso com uma ancestral da futura grande Evita, com a qual teve um filho dançarino e cantor de tango. No Paraguai usava o sexo feminino e teve outro filho que viria a ser cantor de uma banda adolescente homossexual que viria a ser famosa mundialmente após ter mudado para Porto Rico.

          A mãe faleceu por uma guerra de gangues mafiosas quando saía de uma cantina na Mooca, obrigando-o a retornar com o filho argentino, Diego Armando Manuel, em busca de vingança.

          Dieguito era diferente de toda a família fisicamente. Era baixinho e gordinho, com cabelos escuros e oleosos, mas igualmente enfurecido e talentoso. Quando cheirava pó branco ele se sentia invencível, e agredia a quem estivesse pelo caminho, quebrando a tudo e a todos.


          Flortônio se envolveu com a máfia italiana e terroristas cubanos, para traficar pizzas e charutos e para vingar  as mortes da mãe, e em seguida do pai, que foi abraçado por um homem bomba em praça pública e explodiram juntos, espalhando restos mortais nos tanques de peixes ornamentais.

          No Rio de Janeiro Flortônio começou a faturar mais dinheiro protegendo criminosos internacionais em troca de uma percentagem gorda. O primeiro deles foi Ronald Biggs, ladrão inglês de um trem pagador que viveu em segurança por décadas nas praias cariocas.

          Flortônio morreu de AIDS, quando nem se sabia da doença ainda. Talvez tenha sido o hospedeiro número um. Dieguito tornou-se o comandante do império familiar e casou-se com uma lutadora de boxe italiana de 1,90m, linda e destemida; a boca mais suja do planeta! Conhecia a todos os palavrões em qualquer idioma e os utilizava. Praguejava sem pressão e tinha o pavio ainda mais curto do que o do marido.

 
          O filho deles, Manuel Diego Richtoffen saiu com quase dois metros de altura, muito forte, loiro como a mãe e de cabelos Black Power pela genética da família. Herdou a fúria e violência de ambos, e o talento para multiplicar dinheiro também. Gostava de resolver a tudo com porrada e morte de homens, mulheres, crianças e animais igualmente, sem discriminar em nada.
          Todos só perceberam o quão Manuel Diego era perigoso quando ele matou os próprios filhos em um acesso de raiva, espancando-os até a morte, fatiando os corpos e passando num moedor de carnes antes de enfiá-los num saco plástico misturados com cimento e atirados na Baía de Guanabara. Dizem que a poluição desse cartão postal começou aí.
          Os políticos tremeram. As instituições influentes gelaram. Os padres que encomendavam criancinhas queriam excomungá-lo e afastá-lo, mas tinham medo e pressionavam os políticos a prendê-lo. Os políticos queriam vender os serviços de Manuel Diego para as republiquetas de bananas em sua guerra terrorista para alcançar o poder. Mas tais republiquetas tinham medo de perder o poder para o maníaco brasileiro e não aceitaram.
 
          Alguém no fundo da sala de reuniões dos políticos sugeriu timidamente a União Soviética. Foi aclamado como um gênio pela ideia. Entrariam em contato, se livrariam dele e ainda faturariam grande quantidade de vodca e caviar.
          Assim o fizeram. Manuel Diego foi mandado à União Soviética como arma secreta para lutar contra a democracia ianque. Na noite em que ele foi enviado os morros cariocas soltaram fogos de artifício, e naquela época era só por isso. Os políticos realizaram surubas intermináveis com estrelas globais e muito álcool. Só não se tocaram do óbvio: Manuel Diego só foi para a União Soviética por desejo próprio. Tinha planos para o país socialista.
Em breve a parte final da saga de uma família que mudaria o rumo de países inteiros e ficaria incrustada na história para todo o sempre (na história das entrelinhas de quem a conta).
 
Marcelo Gomes Melo

O arauto da destruição - Parte um.
          Saga em três partes de ficção sobre uma parte do Brasil desconhecida pela maioria dos brasileiros, desnudada completamente a partir de agora.
 
 

          A história começou há séculos atrás, quando seu ancestral chegou ao Brasil em um dos galeões de Pedro Álvares Cabral, alistado à força que fora em Portugal; afinal, era isso ou a morte por enforcamento mediante as inúmeras sacanagens que realizara na terra de Dom João, roubando, enganando, garantindo que Dom Sebastião não morreu e sabia onde ele residia, saqueando a Europa. O nome do homem sem escrúpulos era Antonio Manuel, considerado inimigo público número um dos países ibéricos.

          Quando aportou na Ilha de Vera Cruz estava amancebado com uma dama loiríssima oriunda dos países baixos, Netherlands; garota alta e maconheira de princípios liberais com a qual iniciou um prostíbulo se autoproclamando o primeiro cafetão mascate da história do mundo, levando as piranhas a todos os países, já descobertos ou não. Estava instituído o “delivery puta” na Terra de Santa Cruz.

          Circulando entre os indígenas, Antonio Manuel, portuga visionário na arte da corrupção universal logo iniciou a catequização daqueles seres sem alma. Não à maneira do Padre António Vieira, o grande Paiaçu, mas do seu próprio modo. Arranjou algumas índias bonitas e contratou-as como garotas de programa, acompanhantes dos marinheiros, pagando seus salários com espelhinhos e tecidos coloridos, mas enchendo a algibeira de escudos.

          O cafetão da terra brazilis logo percebeu o fascínio que o louro dos cabelos de sua amante holandesa causava nos índios, então montou uma suíte na praia, com camas de folhas de bananeira, servindo água de coco misturada com uísque escocês para que os caciques transassem com a loura em troca de metais preciosos como o ouro. Seu talento empresarial se manifestou quando resolveu exportar perucas para a Europa, raspando os lisos e negros cabelos dos indígenas e faturando alto. É importante contar que foi o inventor do primeiro gel para cabelos do mundo, uma mistura de urucum com urina de porco acondicionados em potes e vendidos para alisar cabelos e barbas longas. Reza a lenda que o famoso pirata Barba azul era seu cliente, e o tom azulado de sua barba era graças ao gel do portuga.


          Antonio Manuel era esperto e nada egoísta quando se trava de ter lucro e assumiu um filho da holandesa com diversos pais, além dele: índios, portugueses e negros africanos recém-trazidos para trabalhar como escravos em nome da glória de Portugal. O garoto tinha pele negra reluzente, cabelos negros e lisos e olhos muito azuis. Logo cultivou um belo e enorme bigode encerado com gel de sumo de pau Brasil, suco de pitanga e urina de bicho preguiça, que dava um tom avermelhado ao bigode e virou moda  entre os importantes da época. Foi batizado como Manuel Antonio e herdou os talentos do pai e a safadeza da mãe; então, quando Antonio Manuel faleceu com gonorreia e febre tifoide, assumiu os negócios da família, expandindo um pouco mais. A mãe, que já não tinha atrativos físicos para a prostituição, passou a comandar o tráfico de ópio e descobriu como usar plantas amazônicas para fazer perfumes que a Europa passou a importar avidamente. O império cresceu e adquiriram algumas ilhas, subornando os corruptos governantes portugueses. As nomearam com os nomes dos netos da holandesa, filhos de Antonio Manuel: Fernando de Noronha e Florianópolis. Seu filho Fernando com uma condessa hispano-portuguesa, Estelita Noronha, que exportou muitos frutos do mar e inventou a paella, triplicando a fortuna da família no ramo de restaurantes especializados na Espanha e no restante da Europa.
          Seu filho Floriano, fruto de sua relação com uma alemã de família de pescadores virou dono da ilha, transformando-a em uma cidade, também comandando o ramo de restaurantes e turismo. A famosa sequência de camarões é, até os dias de hoje adorada pelos gourmets e pelos esfomeados turistas comuns.
          Com o falecimento dos pais, Fernando se alistou e ganhou uma patente militar. Conhecendo Jacques Cousteau pére, o coronel Noronha adotou a sustentabilidade natural e passou a proteger a sua ilha e a natureza, mandando matar os indígenas e reduzir sua ação a alguns lotes de terra. Seu irmão Floriano passou a exportar cerveja e ficou ainda mais rico, fazendo sociedade com o irmão.


          Influentes, logo assumiram postos políticos e inventaram o voto de cabresto. Importaram trens Maria-fumaça e enviaram um casal de confiança para criar e dirigir uma estação ferroviária em São Paulo, que recebia imigrantes do restante do mundo e os enviava para assumir trabalho em fazendas de café no interior de São Paulo e Paraná, principalmente asiáticos, e também para as fazendas de gado para corte e leite em Minas Gerais. Para explorar os metais preciosos usaram Bandeirantes e negros escravizados.
          O casal de confiança era Paulo Antonio, filho de Fernando de Noronha e Flor Ritchoffen, filha de Floriano Manuel. Como os avós e pais, eram muito bons no que faziam, explorar ao máximo a condição humana como escravos. A distância da família e a convivência mútua em São Paulo os aproximou demais. Tornaram-se amantes. Amantes do mesmo sangue produzem aberrações, era o ditado popular. E dessa relação macabra, em que faziam amor em meio a operações de contrabando ou ao som de negros sendo espancados no tronco até a morte, nasceu o futuro rei de Carapicuíba, o conde de Duque de Caxias, o homem que tomou o Acre dos estrangeiros vizinhos e acrescentou ao seu país de origem, iniciando uma indústria de extração de borracha, das seringueiras abundantes da região; o matador do Bonfim, o traficante de pão de queijo de Lambari, o primeiro empresário do bisavô do Pelé! Seu nome: Flortônio Manuel, o visionário.
          Mas o ditado popular de que casais do mesmo sangue produziam aberrações confirmou-se. Flortônio era hermafrodita. Possuía ambos os sexos.
          Acompanhe a saga, segunda parte em breve. Essa é uma obra de ficção, qualquer semelhança com qualquer bandalheira ou não, é mera coincidência.



Marcelo Gomes Melo



As canções boas para beijar



          O saudosismo acomete os mais velhos em dias chuvosos, nublados. Numa embarcação modelo italiano, pelos canais de Veneza do pensamento, sensações de tempos passados retornam produzindo um turbilhão de sonhos e um nó na garganta, na maioria das vezes por delícias inigualáveis e particulares de cada geração.

          Também significa que a idade vem avançando, incólume, e experiência é um acessório importantíssimo para sobreviver à selva da modernidade sem rancores, entendendo que os costumes mudam e a vida segue, mas a memória garante um lugar aos momentos felizes para sempre na história.

          Um dia, ouvindo uma canção do Tavito, que já era considerada flash back à época, lembrei-me dos preparativos adolescentes realizados durante a semana para os bailinhos realizados todos os domingos, revezando as casas de cada amigo em que aconteciam. Aos sábados a balada acontecia em clubes nos quais havia shows. Em São Paulo, locais como Toco, Massa Rara, The Channel, Radar Tantã, Fofinho’s club, Sunday entre muitos outros faziam a alegria da molecada.

 

          A canção do Tavito, “Rua, ramalhete”, com versos que diziam coisas como “muito prazer/Vamos dançar/E eu vou falar no seu ouvido/Coisas que vão fazer/Você tremer dentro do vestido”, era considerada uma canção boa para beijar, como centenas de outras, principalmente as internacionais. Isso fazia com que os garotos ficassem à noite em seus quartos, torcendo para que ninguém entrasse e fizesse barulho durante as gravações das fitas cassete, única maneira de registrar as músicas românticas escolhidas a dedo para a hora da pegação no baile.
          Nomes de astros como Lionel Ritchie, Phill Collins, Betty Wright, Whitney Houston, Spandau Ballet, Luther Vandross, Barry White, Smokey Robinson eram garantia de uma seleção maravilhosa das chamadas músicas lentas. Com essas músicas, em uma seleção de aproximadamente 90 minutos sem interrupção e à meia luz, casais jovens e saudáveis tinham toda a oportunidade para beijar à vontade!

 

          À hora das seleções de balanços todos dançavam separadamente, bebiam vinho e refrigerante, tentavam superar a timidez e arranjar uma menina bonita para a hora das lentas, a hora do beijo. Alguns se davam melhor e logo obtinham um par; outros tremiam e hesitavam, suavam e quase desistiam, a não ser que a oportuna ação cupido dos amigos funcionasse, colocando-os no circuito do amor descompromissado.

          Durante as canções havia a chance de apertar um pouco mais, acariciar os cabelos da garota, fazer elogios... Trocar carícias e beijos. Muitos beijos. A intensidade dependia do poder de convencimento e atração de cada um. Raramente se chegava além disso, mas eram as noites perfeitas.
          No dia seguinte o papo era sempre o mesmo: pegou? Não pegou?! Comeu?! Nem um beijo?! Ahhhh, deixa de ser covarde, ela te deu mole e você pipocou!
          Imagino que entre as garotas o papo fosse o mesmo; e o restante da semana serviria para garimpar novas canções românticas e sonhar com mais amor e mais festa. Hoje isso parece tão antigo! Bizarro, até. Mas era divertido; ah, isso era!
 

Marcelo Gomes Melo


Indissociável de mim!
 

          Eu sou mau. Meus olhos pairam ao longe, indóceis como a potranca que galopa firme em meu peito, aos saltos, em torno de uma fogueira no centro da noite.

          O frio açoita meus ombros, cruel, e meus desejos calejados não sofrem medindo a distância entre a amazona arrogante e orgulhosa por sua solidão consciente, dançando com argolas de prata nos tornozelos, que refletem minhas impossibilidades.

          Eu tento ser mau. Essa maldade peculiar, apregoada em sussurros é tão falsa quanto a generosidade da fêmea que corrói almas masculinas como ácido, dissolvendo determinações a cada segundo da noite que respiramos.

          Nada é real quando se trata de confrontos por amor. Nada é sonho quando olhos permanecem abertos através da noite, com medo do que o amanhecer nos possa trazer.

 
          Cada grão de areia do mundo espalhados pela ventania voraz é idêntico a um som, um grunhido de dor ou prazer que persiste, madame dos meus dias na Terra.
          A crueza dos reflexos é inexorável! Ser mau nesse momento é minha única defesa e não posso negar minha essência. Ela não vê os meus dentes trincados ou não se importa, enquanto move-se em torno do fogo, contorno de sombras pelo corpo indomável, hipnotizante.
          Suçuarana maldosa estende o domínio em seu território e sobre mim, acusando a minha reação, penitenciando-se pela atração que lhe causo, irônico, desejo imortal maculado pela diferença de escolhas. Momentaneamente afastados, o fogo nos separa; ao mesmo tempo nos mantém aquecidos insuficientemente nessa eterna noite de gala.
 
          Apesar dos pesares, notável e altaneira beldade, fera insensível aos desejos dos outros, domadora dos meus prazeres. Queira ou não você é indissociável de mim!
 
Marcelo Gomes Melo

Poetas letais




         A poesia acontece rotineiramente e em todas as instâncias. Não há receita ou apenas um tipo, e a grande prova disso é a natureza que nos cerca e com a qual convivemos. Pura poesia.

          Itamar Assumpção, Rogério Skylab, Arrigo Barnabé, Raul Seixas, Tom Waits, Luiz Melodia, Cassiano, Nick Cave. Lou Reed... Tudo é poesia nessa vida! Fotografias, registros vivos de momentos únicos; não é saudável discriminar, mas é legítimo não compreender.

          O mundo tende a rechaçar as coisas as quais não entende, os motivos escondidos da superfície, que parece ser a única coisa que percebem, as dores que não os alcançam. Ser igual é mais seguro. Repetir o que todos fazem é segurança de reconhecimento, embora carregue toda a inutilidade acoplada a cada criação descartável. Afinal, já dizia Bob Marley “Me criticam por ser diferente, mas rio deles por serem todos iguais”.

 
          Encontre o perigo e descubra o antídoto para uma vida louvável nas entrelinhas do que choca aos iguais. Revigore o cérebro distinguindo os múltiplos acordes de uma guitarra tocada com amor; os dedos deslizam e criam notas fantásticas como olhos pousados no corpo suave de uma mulher entregue.
          Discorde de si mesmo, aos berros, cause uma rebeldia interior que lhe obrigará a sentir aquele gelo no estômago causado apenas pela presença dela no recinto em que você habita; as expressões dinâmicas, espontâneas do rosto dela, a forma enganosa que ela tem de lhe ignorar para se divertir com o seu desespero. Fingimento em forma de tortura, até que se decida e a tome para si.
          Incalculáveis paixões sob o toque audaz e cético dos poetas letais, sem pudores, sem recato, sem nada além do inexplicável.
 
Marcelo Gomes Melo

Meu pecado favorito

 

          Em um banco no centro da estação de trens, com meu violão e meu sobretudo guerreiro por cima de uma camiseta branca com a Marilyn em grafite mandando um beijo para o mundo, com meu amigo estranho de gravata escura e chapéu de feltro, óculos aro de tartaruga, observando as pessoas que transitam apressadas pelo recinto. Por trás dos meus óculos escuros posso encantar uma loura oxigenada, que, falando ao smartphone jamais irá focar a atenção em mim, nem por um instante.
          O meu amigo ajeitado parece um personagem de um filme em Chicago, anos 30, com seu chapéu e gaita no bolso, tentando encantar com um sorriso torto a uma morena bonita encostada em uma banca de jornal, mala ao seu lado e que jamais sorri. Esperando.
          Com o cotovelo lhe chamo a atenção para uma bela negra que passa,  bamboleando com charme, os olhos à frente e uma cadência capaz de acabar com a tristeza. Tudo num estalar de dedos. “Ela olhou pra você”, eu comento; sorrindo encabulado ele rejeita a ideia e diz que ela olhou foi pra mim. Mas a garota segue seus passos, e confirmamos conformados que a vida é mesmo assim.
 
         Se eu tocasse guitarra, se o blues da gaita dele tocasse os corações... Teríamos muito mais sorte com aquelas beldades. Ele me dá um chiclete e comenta, sem ódio ou inveja, apenas melancolia: “Cara, se nós fôssemos só um pouquinho bonitos...”.
          Eu quero ser um dinossauro! O mundo todo é coelhinho. Gosto de cores escuras, mas o vermelho é tão atraente sob o vestido da pequenininha de cabelos em cachos!
          Nós somos homens de aço. Amigos que amam aquelas belas mulheres e ignoram o âmago de suas vidas, acreditando que o futuro pode ser bem melhor. O meu amigo deseja ser apenas alguém de quem as pessoas se orgulhem, enquanto eu preciso apenas de qualquer uma que goste de mim.
          A solidão é tão suave, se alastrando sem fazer alarde por entre as falhas na distância entre os corpos, enquanto a felicidade é astuta e nem sempre está no local em que o barulho acontece. É tão contundente a maneira como ambas atingem pobres garotos do interior querendo ser super heróis, e a vida não pertence a ninguém.
 
          Nós dois queremos ser ricos, ditar as regras no espaço, mas o espaço em que nos vimos ser confinados é cada vez menor! “Eu beijaria a ruiva e deixaria a loirinha com cara de ingênua pra você”.
          Ele diz que teria sorte se fosse Bon Jovi, mas eu acho que seria pop demais; melhor investir mais alto para ser amado por todos. O meu pecado favorito é sob a saia da garota comum da bomboniere, de coxas grossas. Isso arranca sorrisos do meu amigo e restaura a realidade das coisas. Ele empunha a gaita e levanta-se; eu com o violão apoiado nas pernas. Tocamos Couting Crows na estação, notados por ninguém.
          Essa vida é um poço de amargura embalado para presente com fitas coloridas, mas não desistir é o mantra dos desmemoriados. Então, lá vamos nós!
Marcelo Gomes Melo


Os ratos querem o poder!

 
          Eu sei, eu sei que os ratos já estão no poder, não me tomem por um ingênuo qualquer, meus amigos. Também sei que há ratos dividindo o poder e ratos na fila prontos para alternar-se no poder. Ratos cobrindo o telhado e embaixo do seu travesseiro; ratos por todos os lados, ratos em tudo o que vemos, parafraseando os versos dos Titãs. Eu sei, acreditem, eu sei!
          Sei também que um cidadão hoje em dia, bastando ser inescrupuloso, pode caçar ratos com tranquilidade e facilidade, em todos os níveis. Com cubinhos de queijo e uma ratoeira; com algumas moedas de um real consegue um rato para não destruir o seu carro enquanto arrisca a vida assistindo a um jogo de futebol. Com algumas notas de dez reais é possível subornar um rato em troca de benefícios, do tipo atendimento diferenciado em festas, ou restaurantes; com um punhado de notas suborna-se todo o tipo de rato nojento para todo o tipo de coisa. Isso todos nós sabemos, sabemos também que há ratos que subornam, criando e mantendo o círculo vicioso do século.
          As ratazanas de paletó e gravata comandam os ratos de preto com apito na boca; os ratos sacanas burlam as leis que eles próprios criaram cheias de furos, para que outros ratos nocivos os explorem em seus próprios benefícios, em troca de sacos de dinheiro e status.
          Os ratões de esgoto que se utilizam de bandos de ratinhos brancos como cobaias para seus experimentos nojentos que, no final renderão a eles mais poder e mais dinheiro, enquanto os pobres ratinhos serão dizimados. Ratinhos engaiolados que pedalam por centenas de anos acreditando que com o esforço supremo alcançarão algum lugar no qual serão tratados como ratos de respeito, coisa que jamais acontecerá.
          Não precisam me lembrar dos ratos racistas, que são os mais deploráveis dentre os deploráveis! Sujos desgraçados que repudiam e desmerecem outros seres humanos pela cor de sua pele enquanto idolatram ratões malucos que colocam teorias macabras e mortais em prática apenas para acabar com o mundo. Desse lixo desorientado eu já sei, tanto quanto vocês, e vivo indignado tanto quanto vocês.
 
          O título do texto refere-se apenas a um grupo de meninos no final dos anos oitenta que se reuniam aos fins de semana em festinhas, nos parques municipais e pátios escolares, na rua, apenas para dançar. Isso mesmo, dançar! Break dance! Cinco garotinhos dançando um ritmo sensacional propagado por artistas do calibre de Michael Jackson, C+C Music Factory, Tom Tom Club, Kraftwerk, Prince, Afrika Bambataa and The Soul Sonic Force e o avô de todos James Brown... Passos como moonwalk, espelho, parede de vidro, bengala, corda... O Street Dance elevado à máxima potência por garotos que não perdiam tempo com drogas ou aparelhos eletrônicos, nem espancamento gratuito; apenas ação e diversão.
          The Rats Want Power era apenas mais um grupo de break dance de garotinhos da época, e nada tinha a ver com política, corrupção, maldade, racismo e morte.
          Apenas arte. Diversão e arte.
 
                      Marcelo Gomes Melo

Photobook Transilvânia. O fotógrafo pegador.

          Hey, vamos dar um role na Transilvânia, petequinha! Ponha o seu xale dourado e caminhe como se fosse uma meretriz santificada pelos olhos do povo. Já ouviu falar na arte de lamber selos? Não?! Será um prazer além dos limites iniciá-la no passatempo dos deuses numa antiguidade não muito distante, se é que me entende... Só os amanuenses sabem, querida; auxiliares de escritório da Era pré internet, não é do seu tempo, não se preocupe. Continue a mascar seu chiclete e sorrir para a câmera. Você seria uma maravilhosa lambedora de selos!
          Caminhe sensualmente, assim! Beleza, querida; eu faço o que tenho que fazer, sem problemas, sem preâmbulos. O quê? Preâmbulos? Não importa! Usarei a mão direita para imortalizar as suas poses por esses jardins dos castelos romenos. Nada me intimida, pombinha linda! Sou bom com a câmera fotográfica.
 
          Assim mesmo, preciosa, deixe-me entrever a pele macia do seu colo. Tem noção do quanto isso vale? Ser o primeiro a imaginar as pérolas magníficas, e ao vivo, antes que as fotos saiam nas revistas de moda ficando ao alcance de todos os brucutus do mundo? Ou acha que enquanto as mulheres observam as roupas e os detalhes da costura, as cores, os camaradas fazem o quê?
          Outra coisa, amor dos outros... Ah, olhe assim mesmo, assim está perfeito, quase revirando os olhos, quando o âmbar namora desavergonhadamente com a câmera! Perfeito! Chega a causar ciúme. Borrachinha! Mas, a outra coisa não era isso; era o seguinte, candidata a estrela no panteão da futilidade imensa que só o dinheiro pode comprar e a ignorância pode admitir. Você verá que os ricos pensam diferente dos meros mortais Mulheres ricas, especificamente, bombom, guardam em si mesmas um quê de maligno, algo que vem com o dinheiro, não sei bem explicar, nunca fui rico. Nem mulher. Jamais o serei.
 
          Agora, encurralada na sombra contra as pedras; assuste-se com minha urgência de empalador, pecadinho suave, faça! Muito bom! Joelho à frente, pedaço da coxa à mostra. Sensacional! Olhe pra mim, querida, perceba como você consegue mexer com a adrenalina dos machos facilmente!
          Estamos terminando, só mais algumas. Faça uma pose escancarada! Garanta o inefável tesão para as massas alucinadas por momentos de luz! Podemos sair para almoçar em um minuto, o que acha? Naquela cantina romena de origem suspeita. Eu pago! Ensopado à Gary Oldman com cerveja romena da melhor qualidade. Sinta o cheiro delicioso que escapa daquela chaminé centenária!
          Você é uma ótima profissional, minha querida. Por que não me convida para um jantar de comemoração pelo excelente trabalho realizado, essa noite? Vou te pegar no hotel. Só terá que me convidar a penetrar... A propósito, criança, horas de trabalho e não tive a oportunidade de me apresentar à vossa emblemática figura.
          Muito, muito prazer. Meu nome é Vlad!

                                      Marcelo Gomes Melo
 

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